Pessimismo dos consumidores angolanos agrava para níveis do período da Covid-19
As famílias continuam ainda muito pessimistas em relação à evolução da economia. As consequências dos recorrentes sobressaltos da economia angolana são famílias desanimadas, sem empregos, sem salários e com o custo de vida cada vez mais alto e, por isso, não consomem, não investem e não poupam.
O indicador que mede a confiança do consumidor nacional está em terreno negativo há pelo menos seis anos, tendo fechado 2024 em valores de pessimismo muito próximos dos que foram registados em 2020, ano da pandemia da Covid-19, em que a economia nacional registou um afundanço de 5,6%, o maior em mais de duas décadas.
O Inquérito de Conjuntura no Consumidor (ICC) tem como objectivo obter a opinião dos agregados familiares face a vários aspectos da conjuntura económica e permite avaliar o nível ou o grau de confiança das famílias angolanas no que concerne à situação económica e financeira do País, bem como a dos agregados familiares.
No ano passado, o consumidor nacional mostrou-se mais pessimista, já que o indicador fechou o ano nos -19,7, o que compara com os -18,0 e -19,6 apurados no segundo e terceiro trimestre. O relatório refere que, no IV trimestre de 2024, este indicador "estabilizou", considerando que isso representa "a manutenção da expectativa dos consumidores angolanos". Mas o que é certo é que este indicador, apesar de ter estado sempre em terreno negativo desde que foi publicado pela primeira vez pelo INE (2021), tem o pessimismo a agravar-se há 9 trimestres consecutivos, numa escalada iniciada no IV trimestre de 2022, ano eleitoral em que o pessimismo era menos elevado do que actualmente (ver gráfico), beneficiando de uma apreciação do kwanza e da desaceleração da inflação.
Estes números correspondem ao saldo das respostas extremas, isto é, a diferença entre as avaliações positivas e negativas dos chefes de agregados familiares sobre as perspectivas de evolução da economia. Ou seja, no IV trimestre de 2024, em média, a percentagem de famílias inquiridas que tem perspectivas negativas sobre a marcha da economia nacional excedia em -19,7 pontos a percentagem das que tinham perspectivas positivas (confiança).
Assim, nem o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 4,4% em 2024, aquele que foi o maior desde os 4,8% registados em 2014, contrariou esta tendência de pessimismo que vigora no seio das famílias angolanas. Segundo o economista Álvaro Mendonça, este quadro acontece porque o impacto do crescimento do PIB no bem-estar das famílias não é imediato, sobretudo quando esse crescimento é sustentado pela subida das receitas petrolíferas e pelo investimento público e, em menor escala, pelo investimento privado.
"É preciso que esses investimentos gerem emprego e, pela via dos salários, melhorem as condições de vida das famílias, o que fará aumentar o consumo privado e trazer maior optimismo às famílias. Por outro lado, é necessário que a taxa de criação de novos empregos seja suficiente para absorver quem chega ao mercado de trabalho, e isso não está a acontecer. O desemprego em Angola é muito elevado e só não é superior porque uma grande fatia do emprego é informal. E apenas 14% dos angolanos [em idade activa para trabalhar] têm um emprego formal. Há milhares de jovens licenciados que não encontram emprego. Ora quem não tem emprego, também não tem salário", sublinha.
Inflação
Outro factor que contribui para este desânimo entre as famílias está relacionado com a inflação, que no ano passou "fechou" nos 27,5%. "Com subidas de preços desta ordem e actualizações de salários cinco vezes inferiores, as famílias perdem poder de compra. Tudo fica mais caro. E, pior que tudo, é que as pessoas andam desanimadas, depois de quase dez anos de recessão com crescimentos do PIB abaixo do crescimento demográfico e com dois anos de Covid pelo meio. Um ano de crescimento de 4,4% não recupera tudo o que está para trás. E a maioria das pessoas não vê grandes mudanças nas suas vidas", avança Mendonça.
O economista defende que as consequências dos recorrentes sobressaltos da economia angolana são famílias desanimadas, sem empregos, sem salários e com o custo de vida cada vez mais alto e, por isso, não consomem, nem investem, porque não têm os meios para isso, e não conseguem fazer poupanças. "O impacto no consumo privado é imediato. A quase totalidade do rendimento das famílias vai para a renda e energia, para a alimentação, calçado e vestuário essencial, transportes e propinas das escolas dos filhos. A família média angolana vive ao nível da subsistência, sobretudo nos grandes centros urbanos. Consome o que pode e procura os preços mais baixos.
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