Angola tem a taxa de álcool no sangue mais alta permitida para a condução
Num País onde existem problemas de consumo excessivo de álcool e de alta sinistralidade rodoviária, assumiu-se uma taxa de alcoolemia permitida para conduzir de 1,2 g/l, a mais alta nos países da SADC e da CPLP. Especialistas dizem o valor é excessivo e perigoso.
O actual índice de medição da taxa de alcoolemia de referência para efeito de consideração do estado de embriaguez dos automobilistas, que passa de 1 miligrama para 1,2 gramas de álcool por litro (g/l) no sangue, coloca Angola com a taxa de álcool no sangue (TAS) mais alta permitida para a condução entre os países membros da SADC e da CPLP.
Este foi, de resto, um dos pontos mais importantes da alteração que foi feita ao Código Penal angolano, aprovado em finais de Agosto último pela Assembleia Nacional, que acaba de sair em Diário da República.
A alteração visou, essencialmente, proceder à correcção, superação de imprecisões, gralhas e insuficiências registadas no Código Penal, aprovado inicialmente pela Lei n.º 38/20, de 11 de Novembro.
Uma das gralhas, por exemplo, foi a adopção da anterior taxa de alcoolemia de 1 mg (0,001 gramas), que o legislador diz ter sido consagrada por lapso e considerada irrisória em demasia a ponto de absorver o consumo de outros géneros alimentares ou bebidas não especificamente alcoólicas, facto que causava inúmeros dissabores aos automobilistas, sobretudo aos fins-de-semana, quando emergem por todo o lado as barreiras policiais ou as ditas operação Stop.
Se a anterior taxa foi considerada irrisória, a actual é vista como alta demais por diferentes especialistas, e é também a mais alta dos 16 países que compõem a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) e dos nove países membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), que tem na cauda o Brasil com 0,05 g/l (ver gráfico).
A nível da SADC, por exemplo, sete países, nomeadamente a República Democrática do Congo (RDC), Lesoto, Maláui, Namíbia, Seicheles, Tanzânia e Zimbabué têm os limites de condução sob o efeito do álcool fixados em 0,8 g/l, comportando mais da metade dos países da comunidade. As ilhas Maurícias, com 0,2 g/l no sangue, têm a taxa mais baixa da África Austral.
Na CPLP, três países, Cabo Verde, Timor Leste e Portugal têm taxas de 0,5 g/l. Moçambique, com 0,6 g/l, detém a segunda taxa mais alta dos países de língua portuguesa. Para se ter uma ideia, por exemplo, em Portugal se um condutor for apanhado com 1,2 gr/l é considerado crime grave e é penalizado com pena de prisão.
O grupo parlamentar da UNITA diz ter defendido, durante as discussões nas comissões de especialidade, uma tolerância para os automobilistas até um máximo de 0,25 g/l no sangue, pois, como sustenta o partido, acima desta taxa já oferece um risco muito grande para a ocorrência de um acidente.
Mas, como se vê agora, esse ponto de vista não foi tido em conta nos debates, empurrando a oposição a responsabilidade desta decisão para o partido da maioria. Contactado pelo Expansão, não foi possível obter um comentário por parte do grupo parlamentar do MPLA.
Perda de coordenação
O médico neurologista João Bilardo sublinhou que essa quantidade de álcool no sangue pode trazer graves consequências para um automobilista, entre elas a perda de autocontrolo, perda de coordenação, lentidão mental e percepção alterada, que podem causar incapacidade do automobilista para controlar o veículo se for confrontado com um obstáculo na estrada.
Já o médico Jeremias Agostinho, especialista em saúde pública, referiu que 1,2 g/l é muito para um condutor, porquanto as consequências podem ser devastadoras no caso da ocorrência de um imprevisto que pode originar um sinistro.
A Polícia Nacional diz que doravante vai considerar, para efeito de consideração do estado de embriaguez dos automobilistas, a nova taxa prevista no Código Penal, segundo o director nacional adjunto de Comunicação Institucional e Imprensa da corporação, Mateus Rodrigues.
O responsável, que evitou avaliar se a taxa de álcool no sangue permitida por lei para a condução é ou não ideal, disse apenas que a Polícia Nacional de Angola tem a incumbência de fazer cumprir a lei "e é isso que fará", tendo aconselhado os condutores a não consumirem bebidas alcoólicas quando estiverem ou se fizerem ao volante.
A condução sob efeito de álcool é uma das principais causas de acidentes de trânsito em Angola, assim como no resto do mundo. Segundo dados do Conselho Nacional de Viação e Ordenamento do Trânsito, o País registou, entre Janeiro a 31 de Dezembro de 2023, um total de 14.429 acidentes de viação, de que resultaram 3.121 mortes e 17.902 feridos.
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