Programa espacial reinventou-se depois do desastre do Angosat-1
O programa espacial tem duas vertentes muito importantes - as comunicações e a observação da terra. É sobre estes dois eixos que o GGPEN está a construir a sua estratrégia de crescimento, tendo como objectivo gerar receitas para cobrir a sua actividade e contribuir para a construção do próximo satélite em 2/3 anos.
No primeiro dia útil de 2018, dia 4 de Janeiro, o director do Gabinete de Gestão do Programa Espacial Nacional (GGPEN), Zolana João, e o ministro das Telecomunicações da altura, Carvalho da Rocha, foram à Cidade Alta comunicar ao Presidente que o Angosat-1 estava sem responder há vários dias, e que possivelmente se tinha perdido. Poucos dias depois de o lançamento ter sido acompanhado em directo pela televisão pública, com direito a benção das principais igrejas, a presença de muitos convidados famosos, da abertura das garrafas de champagne, um ambiente de festa e de orgulho nacional. Para a opinião pública passava-se a ideia que se estava a tentar retomar as ligações, que nada estava perdido, tese que era confirmada pelos russos, e na verdade só em Abril é que oficialmente se assumiu que o Angosat 1 tinha "morrido".
Este foi o momento em que podia ter acabado o programa espacial nacional. "Ainda lutámos durante uns dias para retomar a telemetria, mas hoje sabemos que foi uma falha crítica na fonte de alimentação, os vários sistemas foram falhando em cascata até o satélite morrer. Na altura, fui ter com o ministro e disse-lhe que o caso ia ter uma enorme repercussão política, os media internacionais também estavam a acompanhar o lançamento e, por isso, pedia a minha demissão. Se tivessem de linchar alguém que fosse o director do GGPEN. Lembro-me que não fazia a barba há várias semanas, ainda tenho fotos dessa altura", recorda Zolana João.
O ministro não aceitou a demissão, pediu-lhe para cortar a barba, e, de acordo com instruções do Presidente da República, mandou-o para a Rússia com uma equipa negociar com os russos, uma vez que existia um seguro que podia ser accionado. Tinham três meses, até Abril, uma vez que estava marcada para essa altura uma conferência de imprensa para explicar todo o processo, que o Angosat 1 se tinha perdido, uma vez que até aí ninguém iria saber que o satélite era um defunto, e seria nesse momento que o governo assumiria, mas tinha de explicar os passos que iam ser dados a seguir.
Negociações muito difíceis, como nos explicaram os envolvidos, mas que acabaram por resultar num novo satélite, com mais um terço de capacidade do que anterior, virado para o serviço de dados, ao contrário do Angosat 1, que era para serviço de voz, entretanto a tecnologia tinha evoluído. Foi também acertado que os russos seriam responsáveis por pagar a manutenção e a evolução tecnológica do Centro de Operações da Funda enquanto durasse a construção do Angosat 2, e suportassem a formação de 15 engenheiros angolanos para fazer mestrados em aplicações espaciais em França, no cento da Airbus em Toulouse. Isto tudo sem custar um dólar aos cofres do País. "Foram lutas que nem imagina para conseguir tudo isto. Eu direi que os russos tiveram de acrescentar 70 milhões de dólares ao orçamento anterior para fazer o Angosat 2", explica.
Quando o governo confirmou oficialmente a perda do Angosat 1 anunciou igualmente a construção do Angosat 2. Mas ia demorar quatro anos até que estivesse pronto. Uma parte da equipa do gabinete acompanhou a construção, mas a maioria foi melhorar os seus conhecimentos com formações, doutoramentos e mestrados em outros países, de forma a conhecer outras realidades, pois um dos problemas identificados com este falhanço, era que os engenheiros angolanos estavam demasiado dependentes dos russos. Na sua maioria, eram jovens abaixo dos 30 anos. Houve também aqueles que abandonaram o programa espacial, uns voltaram às suas actividades anteriores, outros foram contratados por entidades espaciais internacionais, porque este é um nicho de formação e de especialidade raro no mundo.
Em Outubro de 2018, o GGPEN começou a desenvolver um programa de observação da terra, tendo começado o treinamento de 10 técnicos no domínio sobre imagens de satélites, que significa em termos práticos, a extracção de informação útil para os diferentes sectores da economia. "Começámos a capacitação de técnicos nacionais com parceiros internacionais, nomeadamente a Thales Aliena Space, providenciando produtos e serviços com resultados que se estendem até hoje, como é o caso do monitoramento dos derrames de petróleo na nossa costa que fazemos para a ANPG", explica Elcano Gaspar, responsável pela Área de Desenvolvimento de Aplicações Webgis do Laboratório de Desenvolvimento de Aplicações Espaciais.
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