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"Há muito valor que pode ser gerado pela cultura nas comunidades"

Tchissola Mosquito

Introduziu literatura, que lera anos antes, na formação bíblica e cívica que dava a jovens. Colheu ali a certeza que o resgate seria pelos livros, surgem os primeiros clubes de leitura. À biblioteca móvel seguem-se dois labs, em Luanda, e hoje a VPA 2020 está em Benguela e no Namibe, dá trabalho a 11 jovens, alguns são bibliotecários que ajudou a formar. Dez anos depois, Tchissola Mosquito prossegue com a intervenção social e cultural nas famílias tendo por base o livro, projecto que dá a conhecer na entrevista ao Expansão.

O projecto VPA 2020 (Visão, Propósito, Acção) começa com a Tchissola Mosquito. Como?

Começa com o meu voluntariado na Igreja Católica, no meio de grupos de adolescentes a quem dava formação bíblica e cívica e do meu contacto percebi que seria importante introduzir algo mais e comecei a emprestar os meus livros. Eu com a idade deles lia muito, mas contactei com jovens de 15 e 16 anos que nunca tinham lido um livro. Os miúdos gostaram muito e criou-se o primeiro grupo. Depois outro e outro. Até chegarmos aqui à VPA foi uma tomada de consciência individual de que eu podia ajudar um grupo maior de pessoas.

Foi uma espécie de chamamento?

Sim, sou católica e acredito no propósito de vida e que aquilo que nós recebemos de graça devemos dar de graça. Tive o privilégio de crescer numa família estruturada com algumas possibilidades, que me permitiram estudar. Pensei, como é que eu transformo isto que eu recebi naturalmente num bem maior? Como é que eu faço disto algo mais significativo, foi o desafio que lancei a mim mesma. Fui preparando o processo para legalizar a VPA. Comecei o processo em 2011, faz agora dez anos. Em 2017 tinha tudo pronto e dois anos depois, em 2019, passamos a existir formalmente como associação.

Já atingiu a maioridade?

Não, estamos longe ainda. Sonha mais? Claramente. Nós tínhamos planeado abrir em 2020 dois labs, com a pandemia conseguimos abrir apenas um, no Grafanil, e outro em 2021, em Benfica. Temos previsto mais um em Luanda e crescer para as províncias.

Sempre com o livro como ponto de partida?

Exactamente. Nós usamos o livro como ferramenta para formar pessoas. O que nos interes
sa são as pessoas. Eu ia sozinha com a minha caixinha de livros para as comunidades. Hoje já não sou só eu, temos um grupo de formadores e de voluntários. E temos tido muitos profissionais de diversas áreas envolvidos, mas sempre com base nos livros. Trabalhamos em células, em pequenos grupos dentro das comunidades.

Em termos práticos...

Passam a sua experiência pessoal, a sua vida profissional e ajudam a dar referências. Andamos sempre com o livro com foco na formação das pessoas. Temos uma biblioteca móvel e duas físicas. Formámos bibliotecários para preparar as bibliotecas e depois ajudar os usuários e damos emprego a essas pessoas. Neste momento temos 11 funcionários: bibliotecários e auxiliares, que ganham acima do salário mínimo.

Passo seguinte?

Formar arquivistas, porque é a área complementar. Neste momento precisamos de apoios, de mecenas. Isto nasceu comigo, houve um investimento pessoal e financeiro, mas o projecto vai caminhar sem mim um dia e por isso precisamos destes parceiros para nos ajudarem a seguir.

O que é que faz mais falta à VPA neste momento?

Precisamos de livros, sempre. Temos um conjunto de livros em Portugal que precisamos de os trazer para cá, logo precisamos de transporte. Os empresários que tenham importações a vir nos próximos tempos podem ajudar-nos nisto. Precisamos de computadores e secretárias, apoio para pequenas obras que temos nas nossas estruturas, materiais de construção, etc. Algumas instituições podem ajudar-nos pagando o salário de um dos nossos colaboradores. Damos dignidade às pessoas que estão connosco. Temos dois escritórios de advogados que nos oferecem a assessoria jurídica, outro oferece a internet. Fizemos um concurso de poesia e vamos lançar um livro, precisamos de apoio para a edição e lançamento. Se alguma instituição quiser comprar a edição, comprometemo-nos com esse dinheiro a formar mais bibliotecários, na Biblioteca Nacional de Angola, onde temos formado todos os nossos profissionais.

O objectivo é intervir nos núcleos familiares e já não apenas nos jovens isoladamente?

A VPA traz em si o conceito de pequenas comunidades, instituído pelo Papa João Paulo II. Dentro dos pequenos grupos trabalhamos os jovens que por vezes levam os irmãos para os encontros, enquanto os pais trabalham. Muitas vezes os pais querem saber onde é que os filhos estão e envolvem-se na associação. Em meios com mais dificuldades procuramos preparar as próprias famílias e perceber quais as reais necessidades. No caso de Benfica há dificuldades com água procuramos ajudar com água e com alguma alimentação e vestuário. Já identificamos crianças de famílias sem qualquer apoio, mas com muitas capacidades. A estas crianças que percebemos com potencial poderemos, no futuro, dar uma bolsa de estudo, mantendo-as nas famílias.

A VPA está em Luanda, Benguela e Namibe. Estamos a falar de quantas pessoas envolvidas nos clubes?

Não sei bem como se fazem essas contas, mas partindo do exemplo do Grafanil, temos 200 pessoas/dia. Se multiplicarmos por semana e mês teremos umas 20 mil pessoas. Temos 4 clubes em Benguela e 3 no Namibe. Em Benguela estamos num lar de 72 meninas, todas elas fazem parte dos clubes. No Namibe estamos em duas escolas, uma delas tem 4 mil alunos. Estamos em 6 turmas de 45 alunos cada. Por causa da Covid interrompemos mas em Agosto deste ano retomaremos.

(Leia a entrevista integral na edição 622 do Expansão, de sexta-feira, dia 30 de Abril de 2021, em papel ou versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui)