"Muitas vezes vamos pedir dinheiro lá fora que não precisamos"
Edgar Oseas refere que devem definir-se prioridades, parar de construir e aproveitar o que já existe, operacionalizar as infraestruturas que estão paradas ou abandonadas e ter planos rigorosos de manutenção das restantes.
Apesar de associarmos a Rosalina Express ao serviço de mobilidade urbana em Luanda, o grupo hoje é muito mais do que isso. Dê-nos uma ideia do que fazem hoje.
A Rosalina Express é um grupo e está em vários segmentos, embora o core business seja os transportes. Estamos na venda de combustíveis com bombas convencionais na província de Benguela, na hotelaria e na restauração.
Porque é que escolheram entrar nos transportes em Luanda?
Na verdade, não começámos em Luanda. Nós já estamos a servir o País nesta área há mais de 22 anos. Começámos em Benguela, propriamente no Lobito, e fomos crescendo. Começámos muito pequenos, com pouco mais de 7/8 viaturas, e com o andar do tempo acabámos por ter um problema de infraestruturas a nível de Benguela. A malha viária ficou totalmente danificada e as estradas para os transportes são como a farinha para o padeiro. Então tivemos de olhar para Luanda, tendo em conta a densidade populacional e a relativa melhoria da malha viária. Foi isso que nos levou a vir desenvolver a actividade na capital.
Na altura, vinham com mini autocarros, meios mais pequenas, hoje já têm outra dimensão. Como é que se processou este crescimento?
Foi de forma gradual. Na verdade, nós somos o que somos graças à Toyota. Os carros com maior dimensão no início eram Toyota Costers, com 29 lugares. Só depois, há 13 anos, é que introduzimos os autocarros, por via de uma relação que estabelecemos com uma fábrica chinesa. Tendo em conta as características da nossa população, que viaja com muitas bagagens, tivemos de fazer a introdução dos autocarros, que têm uma dimensão de carga diferente e, assim, servir as necessidades dos clientes que viajam connosco.
Em Luanda a concorrência é muito grande por parte dos táxis e das empresas estatais?
Este é um sector onde basta ter um "azul e branco" e começa-se logo a trabalhar. Ou até, às vezes, nem precisa pintar. Se for um autocarro pode começar a transportar as pessoas. O índice de informalidade é muito alto, isso dificulta a gestão, mas é na dificuldade que também se consegue olhar para as oportunidades. Estas oportunidades são derivadas da desorganização.
No meio da desorganização vocês viram que era possível criar aqui algumas regras e fazer negócio?
Exatamente! Reparámos que havia uma procura enorme e que as pessoas não sabiam. Havia uma necessidade enorme de serviços de transporte colectivo organizados. Quando a cidade começou a crescer para as periferias, com novas habitações, novos bairros e novas áreas de residência, estas transformaram-se em autênticos dormitórios. E não se pensou, na altura, na ligação ao centro da cidade onde a maioria da população trabalhava.
Surge então o problema do transporte.
E tentou-se resolver o problema dos transportes com uma solução que concentrou investimentos numa empresa pública, que neste caso conhecemos, que é a TCUL. E foram feitos investimentos colossais no sentido de dar uma solução de mobilidade às populações.
E a verdade é que grande parte das centenas dos autocarros que foram comprados está hoje parada.
Exatamente! Com o processo de reconstrução nacional, as famílias tornaram-se mais exigentes em termos de rendimentos e recusaram-se a aderir ao sistema. Como alternativa, incentivadas pela banca, as famílias passaram então a ver o carro próprio como a solução para se locomover. Só que depois depararam-se com uma situação que não se conseguiu resolver, o trânsito. As pessoas acordam muito cedo para poder chegar ao centro da cidade e isso tem consequências a nível de saúde, a nível de produtividade.
A rede express surge como resposta nesse contexto
É um sistema tipicamente ocidental, convencional, com linhas identificadas por cores, com paragens devidamente e previamente indicadas, através de um mapa de leitura de ligações que faz com que as pessoas consigam saber quais as rotas, quais os horários, quais os locais por onde passa. Reparámos, da forma como fomos recebidos, que havia uma necessidade que estava reprimida. E cresceu de forma muito rápida. Hoje em dia temos muito boa gente que não é obrigada, mas por opção própria, deixa os carros e utiliza a nossa rede express. Nós temos estado a retirar, provavelmente, mais de 7 mil viaturas por dia da circulação.
Qual é a vossa concorrência? São os táxis ou são os autocarros públicos?
Os nossos serviços são muito diferenciados. Concorrência equiparada não temos, por enquanto. Gostaríamos muito de ter, e temos estado a falar com a Macon, por exemplo, porque entendemos que sozinhos não vamos a lado algum. Luanda é muito complexa e vasta, tínhamos de actuar em várias dimensões e há limites de crescimento. E quando uma organização cresce muito rápido, ela tem de ter recursos para subvencionar este crescimento. O crescimento tem vantagens e desvantagens, então se o crescimento for descentralizado, ou seja, por empresas, mas a agirem de forma comum, pode ser vantajoso em termos de controle.
O terminal rodoviário do Kilamba custou centenas de milhões de dólares, foi inaugurado e até agora continua sem ter qualquer utilização há quase dois anos. Não foram contactados para ficar com a infraestrutura?
Na verdade, fomos contactados. Fizemos uma análise do terminal e há muitos riscos associados à infraestrutura. O terminal foi implementado no futuro e nós não vivemos do futuro, vivemos do curto prazo. As pessoas têm de se deslocar para lá chegar. O terminal tem uma estrutura de custos bastante complexa.
E qual é a solução para o terminal?
Tem de ser entregue a uma organização séria, não tem de ser a nós, não fazemos questão disso, mas o Estado tem de abdicar de receber alguma coisa durante uns tempos. Aquele terminal, a curto e médio prazo, é uma despesa que alguém tem de assumir. Quem gerir tem de se comprometer nessa perspectiva, embora entenda que os políticos sentem-se fragilizados de entregar uma infraestrutura pública a uma entidade privada sem qualquer forma de pagamento. Mas, para servir as populações e servir para alguma coisa, vai ter de ser assim. Repito, neste momento, tinha de ser entregue a custo zero e a uma organização capaz, com recursos, porque se for a olhar para aquilo como uma fonte de receita já, vai ficar como está, a degradar-se todos os dias.
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