"O que está a encravar o desenvolvimento económico e social do nosso País é o sistema de produção"
Gilberto Simão considera que existe no País o lobby da importação, que condiciona o desenvolvimento da produção nacional e diversificação económica, e defende apoio ao empresariado nacional para concorrer em igualdade com o investimento directo estrangeiro que entra no País em melhores condições que o financiamento da banca comercial.
A panificação no País tem passado por várias fazes, com a associação a queixar-se de algumas irregularidades e dificuldades dos panificadores nacionais e falta de apoios. Hoje qual é a realidade?
O sector do pão é um muito importante para o desenvolvimento social e económico do nosso país. Estou na cadeia de produção de pão há 40 anos. No passado, fui director de uma grande fábrica que produzia sacaria de ráfia, que é um produto muito importante para o sector primário. E inspirados um pouco pela famosa frase do nosso Presidente João Lourenço, de que a fome é relativa, o desemprego é relativo, estamos engajados num projecto de pão para todos.
Como será este projecto?
É um projecto que, para ser concretizado, precisa de apoio político do nosso Governo. Começa no sector primário com a principal matéria-prima, o trigo. Depois passa para a transformação, onde temos as padarias, as pastelarias, e termina no sector terciário com a distribuição, transporte, etc. No sector primário da agricultura temos um projecto que pode criar 50 mil empregos. E não estamos a falar por falar. Por exemplo, já temos dois associados, um na província do Bié e outro no Huambo, que a produzir trigo empregam 5 mil trabalhadores. Para além de produzirem, transformam e distribuem. Na cadeia toda tem mais de 6 mil trabalhadores. Só um deles. Nestas províncias o Estado tem cerca de 100 mil hectares para a produção de trigo.
Com estas condições, o que falta para a dinamização da produção do trigo no País?
Se queremos diversificar a nossa economia, temos de apoiar a produção nacional. Mas há aqui um empecilho que não deixa, que é o lobby da importação. Tem de haver uma força muito grande do nosso Governo para contrariar isso. Não estamos aqui a dizer que as importações devem ou vão acabar. O que queremos do nosso Governo é apoio e protecção à produção nacional. Se quisermos diversificação da economia, se quisermos que de facto haja desenvolvimento no sector produtivo, tem de haver apoio e protecção.
Que tipo de apoio e protecção?
Vários. Por exemplo, para desenvolver a agricultura, muitos agricultores não têm documentos, não sabem ler e escrever, mas sabem trabalhar. Sabem produzir mandioca, feijão, arroz.. Tem de haver um casamento entre o industrial, comerciante, e o agricultor. O agricultor só tem de se engajar na agricultura, no produtivo. Todas as outras suas necessidades devem ser resolvidas por outros segmentos.
Os vários programas criados pelo Governo para o fomento da agricultura não resolvem estas situações?
O problema não é falta de programas ou projectos. Existem bons programas e bons fundos. Só que não chegam a ser implementados.
Porquê?
O interlocutor para implementar estes programas do Governo chama-se banca comercial. E o banco comercial não é uma instituição de caridade. Tem os seus rigores, as suas exigências, que não podem distanciar-se do contexto internacional. Por isso é que muitos bancos preferem pagar multas ao Banco Nacional de Angola do que atender, cumprir à risca, os avisos do Banco Nacional de Angola. O BNA tem bons avisos, com taxas de juros aliciantes, bonificadas. Mas quem é que chega a essas taxas? O micro e pequeno empresário que não sabe ler e escrever não tem acesso à banca, mas é ele que precisa.
Falta organização dos micros e pequenos empresários?
Falta cultura de associativismo. O Governo é que tem de influenciar isso. Se não influencia, as coisas não vão funcionar. O que está a encravar o desenvolvimento económico e social do nosso país é exactamente o sistema de produção. Porque em qualquer sociedade, o que é determinante é o sistema de produção. Temos neste momento um sistema de produção capitalista, de mercado livre, de concorrência. Neste mercado livre de concorrência, quem é que sobressai? É só o grande. Porque é o grande empresário que tem os requisitos todos para concorrer aos programas que têm sido criados pelo Governo.
Existe o Instituto Nacional de Apoio às Micro, Pequenas e Médias Empresas, (INAPEM), para atender estes segmentos. Não têm tido apoios?
Não desempenha o verdadeiro papel que nós associações queremos que ele desempenhe. Já houve administrações do INAPEM que tocaram no assunto, estavam a fazer um bom papel. Mas se não houver associativismo e cooperativismo no nosso país, as coisas não vão funcionar. Muitas sociedades de grandes economias têm isso. Tem que ter um Estado e dois sistemas, porque o mercado livre de concorrência é só para grandes empresários. Para micros, pequenos e médios, tem de haver um sistema de produção ligado ao associativismo e ao cooperativismo.
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