Os efeitos económicos da política orçamental
O Governo iniciou a preparação do Orçamento de Estado para 2022 num contexto de dramaticidade social (todos os indicadores apontam para a manutenção duma profunda recessão das condições de vida da população) e de instabilidade política, potenciada pelos preparativos das eleições de 2023.
A sua restritividade vai manter-se, seguindo as apreciações de "bom aluno" do FMI feitas no seu Relatório de 21 de Junho passado?
A política orçamental é, provavelmente, a mais importante do leque das políticas públicas. Por várias razões, mas especialmente pelos sinais que dá ao País e aos agentes económicos (empresas e famílias) sobre como as receitas fiscais serão utilizadas (de que modo o Estado/Governo devolve esse dinheiro para a economia e sociedade) - não se deve perder de vista que o Estado não gera directamente, nem rendimentos, nem produção(1), limitando-se a ser um mero intermediário entre os contribuintes, que a título gratuito lhe entregam proporções diferenciadas dos seus rendimentos (salários, lucros e juros), e a economia (fomento do crescimento) e a sociedade (famílias) corrigindo os mecanismos da distribuição primária do rendimento nacional. O Estado/Governo acaba por ser um gestor destes mecanismos de aplicação das receitas dos impostos. Por isso é que tem de ser confiável, senão, por muitas campanhas que existam para estimular ou obrigar cidadãos e empresas a pagar tributos, a tendência será sempre a da evasão e fraude fiscal. O Estado tem de dar sinais muito concretos da sua competência, honestidade e transparência no uso de fundos públicos, de todos, para estimular o crescimento da economia e promover melhorias consistentes e sustentáveis no nível de vida dos cidadãos. É para isto que os Orçamentos de Estado e a política orçamental existem, e não para facilitar e estimular processos de enriquecimento dos agentes políticos da governação, seus familiares e amigos. Daí a necessidade de serem respeitadas regras de elaboração dos Orçamentos de Estado, como a da universalidade, a da especificidade, a da não consignação de receitas, a do orçamento bruto, a da anualidade e a do equilíbrio. Esta última é basilar: não se deve gastar mais do que se tem. É um princípio também aplicável aos orçamentos das empresas e das famílias. O seu incumprimento sistemático gera défices e cria dívida. Não necessariamente nefastos, dependendo para onde o dinheiro vai. Ou seja, se o excesso de despesa for aplicado no aumento de capacidade de geração de rendimentos adicionais, então défice e dívida podem ser virtuosos e serem debelados nos ciclos económicos e financeiros seguintes. Exemplos: investimento público e privado em capital físico e investimento público e privado em capital humano (sobretudo educação, incrementando-se a produtividade do factor trabalho e as respectivas remunerações).
Como é do conhecimento geral, o Orçamento Geral do Estado de Angola tem registado défices fiscais sistemáticos desde 2014, perfazendo um acumulado em 2020 de -20% do PIB(2). Trata-se de uma violação clara da regra do equilíbrio orçamental, só atenuada se os efeitos económicos das despesas públicas (crescimento económico e melhor distribuição do rendimento) forem positivos. Um aumento das despesas públicas provoca um incremento do produto nacional e do emprego, equivalendo a um efeito expansionista sobre a actividade económica(3).
O CEIC, no âmbito das suas acções de estudo e de pesquisa, tem-se preocupado com a eficiência dos gastos públicos. Nota-se uma correlação quase perfeita entre gastos públicos e evolução do PIB nominal, a despeito de em alguns períodos se apresentar desproporcionada e de sentido inverso, talvez devido à influência de outras variáveis como o investimento privado e o consumo das famílias, potencialmente aumentado pelas remunerações dos funcionários públicos. Na verdade, entre 2006 e 2009, os incrementos nominais nos gastos públicos foram superiores ao crescimento do PIB nominal (provavelmente pouca eficácia dos mesmos, prevalência de influências negativas, internas e externas, sobre a economia (crise económica internacional 2008/2009, queda do preço do petróleo), enquanto no período 2009/2011 parece registar-se o efeito multiplicador das despesas do Estado sobre a economia (Ky,g>1).
*Economista
(Leia o artigo integral na edição 632 do Expansão, de sexta-feira, dia 9 de Julho de 2021, em papel ou versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui)