Crédito à economia: diagnóstico, obstáculos e perspectivas até 2025
Para a dinamização do mercado, é necessário que não se coloquem entraves às transacções e que a execução das garantias seja célere, o que pressupõe, como contrapartida, a criação de mecanismos de protecção mais eficazes para os casos de insolvência, garantindo a protecção pelo Estado das pessoas envolvidas, mas sem prejudicar os direitos dos credores a receberem o seu quinhão e a poderem, rapidamente, liquidificá-lo.
O peso do Estado sobre o total de crédito concedido à economia é muito significativo, mas, pela segunda vez em três anos, este valor é inferior a 50%, representando 46% do volume de crédito no final de 2024, abaixo da média da série (51%). O crédito ao Estado teve uma redução de 806 mil milhões, enquanto o dos outros sectores aumentou 611 mil milhões, do que resultou a inversão da relação de 51/49 para 46/54. Em Fevereiro de 2025, o peso do Estado sobre o total de crédito regressa aos 50%.
Apesar de tudo, cinco anos depois do lançamento do PRODESI (Programa de Apoio à Produção, Diversificação das Exportações e Substituição das Importações), o peso do Estado na economia continua a ser imenso.
Rácio dos empréstimos bancários
O rácio de conversão dos depósitos em empréstimos, um dos mais usados para aferir a liquidez da banca, anda à volta dos 50%. Este "indicador" de confiança na economia é-nos fornecido pela banca. Antes da crise, já a banca estava a reduzir o risco; em 2024, a banca retoma uma confiança crescente, concedendo mais crédito.
Apesar do peso do Estado, continua a existir liquidez suficiente na banca para conceder muito mais crédito à economia. Os recursos estão lá, apenas substancialmente reduzidos pelo crescimento desmesurado das reservas bancárias.
O problema do peso do crédito ao Estado reside em oferecer um risco reduzido, permitindo à banca manter uma boa rentabilidade sem ter de enveredar pelo negócio de elevado risco e rentabilidade por vezes negativa, devido ao ambiente de negócios, que constitui o crédito às empresas. Ou seja, o capital dos bancos é suficientemente remunerado pelo crédito ao Estado, enquanto a expectativa da banca para o crédito à actividade privada parece ser negativa para a generalidade dos projectos, tendo em conta o risco.
Nessas circunstâncias, só uma forte e duradoura redução do crédito ao Estado, com a consequente redução da rentabilidade dos capitais da banca, poderia justificar um forte investimento no controlo do risco que permitisse aumentar o crédito à actividade.
Porém, a despesa pública cresce todos os anos a uma taxa superior às receitas, forçando o Estado a recorrer ao financiamento interno para fechar o défice. Enquanto não houver disciplina e redução da despesa fiscal, a banca não terá razões para correr riscos na economia real.
A banca também reage por inércia. Está habituada a um dado nível de rentabilidade com pouca concorrência e pouco risco e não vê justificação para alterar o modelo de negócios. Porém, se ao menos o Estado usasse o crédito para mitigar os riscos a que estão sujeitas as empresas que operam no sector real da economia, a banca mudaria de estratégia. Sem estes esforços, o crédito não aparece. Contudo, parece haver agora um retorno aos indicadores de 2022, o que é um bom sinal.
Concessão de crédito nominal
Após um crescimento substancial no 3.º Trimestre de 2024, o crédito à produção volta a baixar no final de 2024, menos 146 mil milhões de Kwanzas face ao período homólogo. O crédito líquido à produção foi negativo nos 1.º e 4.º Trimestres de 2022, aceitável apenas nos 2.º e 4.º Trimestres de 2023 e 3.º Trimestre de 2024, e anémico em todos os restantes.
De notar que há uma distorção nestes valores resultante da variação cambial: um crédito de 1.000 USD valia, no início de Maio de 2023, cerca de 505 mil Kwanzas e, no fim de Junho, cerca de 822 mil. A fraca concessão efectiva de crédito dá a estas variações cambiais um peso significativo.
Desde 2022 até final de 2024, o crédito nominal à produção totaliza cerca de 2.567 mil milhões de Kwanzas, com um valor médio de 71 mil milhões por mês, claramente insuficiente para os desafios da economia angolana. O crédito às famílias soma 1.207 mil milhões de kwanzas, representando 32% do crédito total.
O problema principal parece estar na oferta de crédito por parte da banca, que continua a evitar alterar o seu modelo de negócio, aumentando o risco. A banca privilegia sobretudo o crédito ao Estado porque tem taxas mais elevadas e risco reduzido. Não é fácil alterar a situação.
A par dos sistemas de crédito formais, os negócios recorrem a esquemas alternativos de crédito, nomeadamente o crédito mutualista sem juros, conhecido como Kixikila, e o crédito particular com taxas de juro elevadíssimas, superiores a 100% ao ano, bem como o crédito pessoal para financiar os negócios. Os esquemas de microcrédito não funcionam: quando são concedidos ao abrigo de programas do Estado, são tidos como apoios não reembolsáveis e não como empréstimos. Há quase tudo a fazer no que diz respeito ao crédito aos pequenos negócios; de momento, o microcrédito satisfaz apenas uma percentagem muito reduzida da procura.
Leia o artigo integral na edição 825 do Expansão, de Sexta-feira, dia 09 de Maio de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)
Bernardo Vaz, Economista