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Opinião

Combate à venda ambulante vai destapar o rosto da pobreza em Angola

MILAGRE OU MIRAGEM?

No último Índice de Pobreza Multidimensional de Angola, de Julho de 2020, o INE mostrou que a incidência da pobreza é de 55,2% entre as mulheres chefe de família (vs 53,5% homens) e tem uma intensidade de 49,9% entre as mulheres (vs 48,5% homens). Atendendo que 55,3% dos angolanos trabalha por conta própria, segundo o IDREA(2) 2018-2019 do INE, e dentre estes 73,9% são mulheres (vs 48,1% homens), claramente que esta medida vai ter um impacto negativo principalmente entre as mulheres.

De um tempo a esta parte, notamos que o Governo da Província de Luanda (doravante GPL) proibiu a "venda ambulante e desordenada"(1) em várias zonas da cidade de Luanda. A razão desta medida do GPL tem a ver com o facto dessas vendas causarem sérios problemas à circulação rodoviária. Apesar de concordarmos que os transtornos no trânsito são uma realidade, não podemos deixar de reflectir sobre o impacto da medida nos seus principais destinatários.

Mais uma vez, parece-nos que quem tomou a decisão estava mais preocupado em atacar os efeitos do que as causas. A venda ambulante só acontece porque as pessoas não encontram alternativas para sobreviver. A informalidade em Angola, segundo a "Estratégia de Transição da Economia Informal para a Economia Formal" do Governo de Angola publicada em Julho de 2020, tem um peso que vai dos 40% aos 60% do PIB e movimenta anualmente cerca de 43 a 64 mil milhões USD. Todavia, é necessário distinguir os vários níveis desta informalidade uma vez que ela não é homogénea. Não acreditamos que os valores indicados como sendo movimentados pelo sector informal em Angola sejam fruto da venda ambulante, que está a ser combatida pelo GPL.

No último Índice de Pobreza Multidimensional de Angola, de Julho de 2020, o INE mostrou que a incidência da pobreza é de 55,2% entre as mulheres chefe de família (vs 53,5% homens) e tem uma intensidade de 49,9% entre as mulheres (vs 48,5% homens). Atendendo que 55,3% dos angolanos trabalha por conta própria, segundo o IDREA(2) 2018-2019 do INE, e dentre estes 73,9% são mulheres (vs 48,1% homens), claramente que esta medida vai ter um impacto negativo principalmente entre as mulheres.

Apresentado desta forma, fica claro que deveria ser preocupação do GPL assegurar que as pessoas não fossem forçadas a buscar a sua sobrevivência nas ruas de Luanda. Para tal, era necessário que a economia gerasse mais empregos condignos no sector formal. Todavia, a aposta do Executivo tem passado pela disponibilização de kits de auto-emprego, através do Plano de Acção para Promoção da Empregabilidade, construção de mais mercados, e o registo daqueles vendedores que hoje se encontram nos vários mercados de Luanda, medidas que, em nosso entender, não concorrem para a criação de trabalho condigno, conforme sugere o Objectivo de Desenvolvimento Sustentável Nº 8.

Angola, em nosso entender, precisa adoptar a mesma estratégia que países como a Etiópia, em África, e Bangladesh, na Ásia, apenas para apresentar exemplos mais recentes, adoptaram, i.e., fomentar segmentos da economia formal intensivos em mão-de-obra (não qualificada e semiqualificada, com habilitações literárias baixa). No caso dos países mencionados, a aposta foi na indústria têxtil e confecções, tirando proveito de programas como o AGOA - African Growth and Opportunity Act que permite alguns países terem acesso privilegiado ao mercado norte-americano (EUA).

O processo de reabilitação da indústria têxtil deveria ter gerado vários postos de trabalho, directos e indirectos, no sector formal da economia e servir para atrair novos investimentos privados (nacionais e estrangeiros) no segmento das confecções com vista a tirar proveito do programa AGOA. Notem que, a reabilitação da empresa Nova Textang II levou seis anos e custou 235 milhões USD, a Satec no Dondo, Kwanza Norte, 480 milhões USD e, por último, a África Têxtil em Benguela 410 milhões USD. Porém, apesar do tempo que levou o processo de reabilitação, contra todas as expectativas, o Executivo angolano não foi capaz de fomentar a produção interna de algodão, continuando as empresas (agora reabilitadas) a depender da importação. Angola teve acesso a um outro financiamento, da Coreia do Sul, de 66 milhões USD, para produção de algodão no Cuanza Sul em 2006, sem que até hoje se saiba o que correu mal. Consequentemente, os reembolsos desses financiamentos continuam a pesar na dívida externa, sem que Angola esteja a tirar o devido proveito no que toca à diversificação das exportações e criação de empregos. Este é um problema que não foi solucionado na administração Dos Santos nem no 1.º mandato de João Lourenço. Vale recordar que a oportunidade criada pelo AGOA deixará de existir em 2025.

(Leia o artigo integral na edição 722 do Expansão, desta sexta-feira, dia 28 de Abril de 2023, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)

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