Angolanos gastaram 31 mil milhões Kz em apostas desportivas só no I trimestre
Estes números são a imagem fiel das ruas das principais cidades do País, com pessoas cada vez mais "coladas" aos mediadores de apostas e às plataformas on-line. Se por um lado as apostas estão a gerar receitas fiscais, por outro, podem fazer disparar o vício e a degradação social, alertam especialistas.
Os angolanos já gastaram 31 mil milhões de Kz, equivalente a 36 milhões USD, em apostas desportivas só no primeiro trimestre deste ano, de acordo com cálculos do Expansão com base nos dados da Folha de Informação Rápida (FIR) do Instituto de Supervisão de Jogos (ISJ). As apostas desportivas já valem 89% de toda a receita fiscal do Estado com os jogos.
Este crescimento é sustentado pelas apostas online, que registaram uma subida de 400% face ao I trimestre do ano passado, atingindo os 12,1 mil milhões Kz.
Em Angola o sector dos jogos está repartido em jogos sociais, em que até agora têm sido apenas as apostas desportivas online e as de base territorial (as denominadas "fichas"), e jogos de fortuna e azar, mais concretamente casinos. Em termos globais, o volume das apostas nos jogos sociais e fortuna ou azar no I trimestre fixou-se em 41,1 mil milhões Kz, pouco mais de 48 milhões USD, com as apostas desportivas a terem um peso de 74% neste valor. Ao todo, as apostas desportivas à cota de base territorial (feita através dos mediadores) registaram 18,4 mil milhões Kz enquanto os jogos remotos em linha (apostas desportivas on-line) registaram 12,1 mil milhões Kz.
Na prática, regista-se em Angola uma tendência que acontece lá fora, que é o crescimento expressivo que os jogos remotos em linha (apostas desportivas on-line) têm vindo a registar ano após ano. Ainda que no País, prevaleça a aposta ainda presencial, um sinal de que a era da internet ainda não chegou a todos.
Estes números são a imagem fiel das ruas das principais cidades do País, com pessoas cada vez mais "coladas" aos mediadores de apostas das principais operadoras e às plataformas on- -line. É quase uma antítese ao momento actual da economia angolana caracterizada também pela descapitalização dos cidadãos. "As pessoas procuraram mitigar a falta de emprego ou os baixos salários com receitas extraordinárias. Os jogos são uma grande escapatória para os indivíduos que estão na condição de desemprego ou em circunstâncias em que o emprego não gera renda suficiente para o conjunto de despesas que têm no final de cada mês", explica o jurista Joaquim Jaime ao Expansão.
De acordo com o jurista, sempre que as pessoas apostam o cérebro produz automaticamente a sensação de pré-compensação, ou seja, há uma espectativa que é criada até ao "cair da ficha" ou ao eventual sucesso, o que geralmente pode levar à dependência do jogo, que depois provoca problemas nas famílias.
Se por um lado há este fenómeno que pode resultar no vício e na degradação social, do outro estão as receitas fiscais que o Estado arrecada através do Imposto Especial de Jogos (IEJ), que nos primeiros três meses do ano chegaram a 4,23 mil milhões Kz, dos quais 98% resultaram da exploração directa dos jogos e 101,7 milhões Kz, que corresponde a 2%, foram arrecadados através de emolumentos da actividade. Nos primeiros três meses do ano, as receitas fiscais cresceram 124% em comparação com o período homólogo do ano passado, fruto da "introdução de tecnologia no sector, o que garante rigor e transparência, dinamizando o jogo remoto em linha", de acordo com Paulo Ringote, director geral do ISJ.
O mercado dos jogos sociais esteve em alta também por causa da autorização do alargamento da actividade na tipologia de apostas desportivas à cota de base territorial, que chegaram às províncias do Bengo, Uíge, Bié, Malanje, Cuanza Norte, no final de 2023, o que resultou no aumento dos mediadores. De acordo com Paulo Ringote este factor influenciou 59% no aumento da arrecadação da receita fiscal do período em análise.
As reformas fiscais no sector, que propiciaram a diminuição das taxas e o alargamento da base tributária, também ajudaram na arrecadação fiscal deste período.
A receita fiscal com a exploração directa dos jogos sociais fixou-se em 4,1 mil milhões, sendo que 2,0 mil milhões Kz foram com as apostas em mediadores (48,8%), enquanto as plataformas online renderam 1,7 mil milhões Kz (40,4%). Os restantes cerca de 400 milhões Kz foram obtido com jogos de fortuna e azar (casinos), representando 10,8% do total dos impostos arrecadados.
Para Joaquim Jaime, o Estado deveria reencaminhar parte das receitas fiscais dos jogos para promover estudos sobre o impacto dos jogos na sociedade angolana, assim como financiar a compensação social com centros de reabilitação para dependentes, de modo a para fazer o equilíbrio, tal como acontece noutras realidades.
Leia o artigo integral na edição 779 do Expansão, de sexta-feira, dia 07 de Junho de 2024, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)