Compreender a Angola de amanhã... hoje: a integração económica interna (parte II)
Em Angola, o caso do petróleo é paradigmático e a doença holandesa o exemplo mais acabado de utilização deficiente e desequilibrada de recursos minerais não renováveis em favor de classes empresário-políticas dominantes. Os efeitos dilacerantes do "rent seeking" estenderam-se aos países em desenvolvimento ricos neste recurso mineral, mas que não têm as capacidades de resiliência duma Holanda (onde este fenómeno foi primeiramente observado e estudado), assentando o seu crescimento em estruturas produtivas débeis, desequilibradas, sem capital humano, sem capacidade tecnológica e sem matrizes de relacionamento intersectorial agregadoras de valor e criadoras de emprego.
Outro aspecto delicado das assimetrias regionais, além das infraestruturas, poder de compra e massa crítica, relaciona-se com a densidade populacional, igualmente um elemento da dimensão dos mercados. A fraquíssima densidade populacional de muitos municípios, mormente do interior, desconeta-os do todo nacional, votando-os a actividades económicas primitivas e de quase subsistência e à margem da civilização, tornando-se apetentes à ocupação estrangeira da parte dos países fronteiriços. A questão que está aqui em discussão é a da política demográfica do país, da dimensão populacional óptima e da desertificação de amplas zonas do interior. Mas a fraca dimensão populacional relativa também influencia a localização dos serviços de justiça, saúde e educação: as economias de escala e as poupanças públicas dependem, afinal, da quantidade de utilizadores de cada município.
Acresce ainda que as oportunidades de investimento em Angola, na sua perspectiva provincial, acabam por ser todas semelhantes, mesmo que se possam identificar vantagens competitivas naturais relacionadas com as características idiossincráticas de cada província, tais como recursos minerais, florestas, mar, terras aráveis, pecuária, belezas naturais, incidências histórico-culturais, disponibilidade de água, etc. No entanto, e de acordo com algumas evidências empíricas reveladas por estudos adrede elaborados e mesmo com a evolução do pensamento económico, parece que as vantagens competitivas construídas acabam por se impor e mostrarem- -se mais determinantes do que as naturais. Se assim não fosse, dificilmente se explicariam os casos de sucesso económico permanente e sistemático de países como Suíça, Áustria, Japão e mesmo a República da Coreia.
Evidentemente que mais vale ter-se recursos naturais do que não. A questão está em como os aproveitar e inserir nos diferentes sistemas produtivos e modos de produção nacionais e regionais (o exemplo da China merece estudo nestes aspectos). Em Angola, o caso do petróleo é paradigmático e a doença holandesa o exemplo mais acabado de utilização deficiente e desequilibrada de recursos minerais não renováveis em favor de classes empresário-políticas dominantes. Os efeitos dilacerantes do "rent seeking" estenderam-se aos países em desenvolvimento ricos neste recurso mineral, mas que não têm as capacidades de resiliência duma Holanda (onde este fenómeno foi primeiramente observado e estudado), assentando o seu crescimento em estruturas produtivas débeis, desequilibradas, sem capital humano, sem capacidade tecnológica e sem matrizes de relacionamento intersectorial agregadoras de valor e criadoras de emprego.
Valem estas considerações para referir que, internacionalmente ou internamente dentro de cada país, são outras as valências que acabam por distinguir os países entre si e as regiões (províncias no caso de Angola) no seu interior, aparecendo hoje como diferenciadoras e fonte de progresso, o capital humano, o capital institucional, o capital social e o capital empresarial. Havendo-os, as oportunidades de investimento serão em maior número e a capacidade de atraccão do sector privado mais relevante. E a explicação é simples: o capital humano, por exemplo, é, até hoje e no contexto das Teorias do Desenvolvimento Económico Endógeno, o único factor com rendimentos à escala crescentes, ao contrário da terra, do capital físico e do trabalho indiferenciado. As províncias do país que conseguirem aliar à sua disponibilidade de recursos naturais estas valências, seguramente que vão conseguir transformar potencialidades de crescimento em realidades efectivas, criando-se mais emprego, melhorando-se o consumo das famílias e até promovendo transformações nas suas forças produtivas e relações de produção.
O capital humano é recorrentemente referido em Angola enquanto necessidade para o desenvolvimento económico e o progresso social. Verdade de La Palisse. Porém, e por vezes, muitas das entidades privadas e públicas e mesmo individualidades ao referirem-no não têm a dimensão da sua importância estratégica, fazendo-o apenas por uma questão de moda (tal como a diversificação e mesmo a substituição das importações). Por exemplo, as províncias que em Angola forem capazes de oferecer aos investidores privados um sistema de ensino primário permanente, extensivo e de qualidade terão afinal construído agendas de competitividade próprias. O ensino primário é o berço do desenvolvimento, é onde tudo começa e sendo de qualidade os efeitos de arrastamento a jusante são incomensuráveis, em especial sobre a produtividade geral do trabalho. Mas também sobre os parâmetros de aferição do ensino técnico e universitário.
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