Desresponsabilização
Isto além de ser extremamente injusto para os competentes, alimenta esta franja de gestores que movimenta milhões e que não tem capacidade nem para gerir a própria casa, que mistura sucesso profissional com o número e qualidade dos carros que "sonegou" da máquina pública e dá um péssimo exemplo à nova geração.
Em conversa com alguns empresários nacionais percebo melhor porque é que não temos uma classe empresarial angolana de média e pequena dimensão suficientemente forte para garantir níveis de emprego satisfatórios e uma geração de riqueza mínima para que os cidadãos possam ter uma vida melhor.
A primeira razão é a forma como o Estado e as instituições públicas pagam aos seus fornecedores, especialmente se estes não são suficientemente grandes ou bem colocados politicamente para exigir o cumprimento de contratos. Se quem dirige estas instituições insiste em pagar muito para além dos prazos acordados, em prestações não combinadas ou títulos de dívida, obviamente que as empresas têm uma enorme dificuldade em manter a sua actividade.
Mas a maioria destes empresários não podem fazer nada porque, na verdade, o Estado e as empresas públicas estão em todos os sectores, são eles que compram e vendem, que constroem e não é possível, por enquanto, que uma empresa pequena ou média possa crescer sem ter o Estado ou as instituições públicas como clientes. Ou assumem que se vão manter pequenos, ganhando para si ou para a família, ou então ser sempre "subs" - sub-empreiteiros, sub-fornecedores, sub-criadores - das grandes empresas nacionais ou estrangeiras que ganham sistematicamente os maiores contratos por adjudicação directa junto destas instituições. Não correm o risco de receber a perder de vista, é verdade, mas entregam uma fatia importante do lucro que podiam ter para si.
O Estado, que devia olhar para estes empreendedores com algum carinho e respeito, e como quem dirige a maioria das instituições não consegue retirar dividendos similares aos que os maiores grupos económicos lhes proporcionam, não lhe liga coisa nenhuma. Mesmo que isso signifique mais custos para as instituições que chefiam, até porque nas instituições e empresas públicas ninguém pede contas aos gestores, desde que os desvios não atinjam valores escandalosos. Como sabemos, não existe controlo de gestão na maioria das entidades da administração pública ou das empresas públicas.
Este é seguramente um dos únicos países onde as empresas públicas apresentam sistematicamente resultados negativos, onde as despesas correntes aumentam muito mais do que o investimento, em que, em contrapartida, as vendas vão encolhendo, mas os administradores não são responsabilizados. É verdade que se exoneram alguns, mas sem que nunca ninguém assuma publicamente porque o fez. Passam um período sabático de alguns meses em casa e, de repente, já estão nomeados para uma nova missão do Estado, "empurrados" pela lealdade partidária ou familiar.
Isto além de ser extremamente injusto para os competentes, alimenta esta franja de gestores que movimenta milhões e que não tem capacidade nem para gerir a própria casa, que mistura sucesso profissional com o número e qualidade dos carros que "sonegou" da máquina pública e dá um péssimo exemplo à nova geração. Já repararam que a maioria dos jovens que são quadros do Estado e da Administração Pública não tem uma postura crítica perante as coisas e os desafios. E isso impacta muito no desenvolvimento do País, porque este só avança com medidas inovadoras e disruptivas.
O que quero dizer é não podemos manter esta postura de desresponsabilização de quem tem cargos de chefia, directoria ou administração nas instituições públicas. Temos de ser mais exigentes com quem decide, o que fazer com o dinheiro de todos nós. E era bom que os exemplos viessem de cima, para ajudar esta causa!