Zangam-se as comadres...
Os accionistas da Unitel andam de candeias às avessas. De um lado, os angolanos, que têm no conjunto 75% do capital da maior operadora móvel nacional; do outro, a Portugal Telecom (PT), que detém os restantes 25%.
Os 75% angolanos estão divididos em três participações iguais, de 25% cada, detidas pela Mercury, subsidiária da Sonangol, e duas sociedades denominadas Geni e Vidatel. Oficialmente não se conhecem os accionistas da Geni e da Vidatel. Contudo, o grupo Cochan, controlado pelo empresário Leopoldino Fragoso do Nascimento, assume na sua página da Internet ser accionista da Unitel sem, no entanto, referir qual a percentagem de capital que detém e através de que sociedade.
O mais provável é ser através da Vidatel, já que a Geni será controlada pela empresária Isabel dos Santos. Quem quer que sejam os accionistas angolanos da Unitel, o certo é que se apresentam em sintonia perfeita. Como noticiou o Expansão, as tensões entre os accionistas da Unitel vieram a público em Fevereiro deste ano, quando o presidente da PT,
Henrique Granadeiro, acusou, em entrevista à Reuters, a gestão da Unitel de não pagar dividendos de 246 milhões de euros, em falta desde 2011. Em 25 de Março, a Unitel respondeu, em comunicado, que não pagaria dividendos à PT por esta os ter pedido através de uma empresa que não consta do registo accionista, no caso a PT Ventures.
A resposta da PT não se fez esperar. Dois dias depois, a 27 de Março, também em comunicado, a operadora portuguesa garantiu que "recebeu até Novembro de 2012 dividendos distribuídos pela Unitel em nome da accionista PT Ventures (…)". Segundo a telecom portuguesa, o que se passou foi que, em 2002, a PT Internacional, originalmente accionista da Unitel, alterou a sua designação para PT Ventures, "mas é a mesma companhia".
É a mesma companhia, mas os seus accionistas não. Em 2007, a PT Ventures passou a ser detida a 100% pela Africatel, uma holding criada para agrupar as participações da PT na África Subsariana. Por sua vez, a Africatel é detida em 78% pela PT e em 22% pelo Helios, um fundo de capital de risco nigeriano, supostamente ligado a George Soros, magnata de origem húngara. Ou seja, na prática, por cedência da PT, o Helios passou a deter indirectamente, via Africatel, 5,5% da Unitel.
A maka, segundo se queixaram os accionistas angolanos da Unitel em carta dirigida à PT, é que isso foi feito "sem comunicar aos restantes accionistas". O tema foi abordado numa assembleia- -geral em Novembro de 2012, de onde "resultou clara a quebra de confiança entre os accionistas", garante a parte angolana. Segundo o comunicado da Unitel de 25 de Março, o acordo parassocial celebrado entre accionistas da empresa em 2000 estabelece que "os accionistas da Unitel gozam do direito de preferência sobre acções da Unitel no caso de uma transacção ou fusão".
Não sou jurista, mas estou em crer que passagem dos 5,5% da Unitel para o Helios pode não configurar uma violação do acordo parassocial, porque o accionista de controlo final da PT Ventures, que detém 25% da Unitel, continuou a ser a PT SGPS. O caso poderá mudar de figura se a PT avançar com a fusão com a brasileira Oi, como previsto.
Se isso acontecer, o accionista de controlo final passará a ser a empresa que resultar da fusão e, então, os accionistas angolanos terão legitimidade para accionar o acordo parassocial e exercerem o direito de preferência como é seu desejo. Em todo o caso, é minha convicção que, independentemente da fusão da PT com a Oi, a relação entre a PT e os seus parceiros angolanos chegou ao fim da linha. E isso não tem que ver com mudanças na PT e, consequentemente, nos 25% que os portugueses detêm na Unitel.
O problema de fundo reside nos interesses divergentes entre a PT e os seus parceiros angolanos na Unitel. A Unitel, directa ou indirectamente, através dos seus accionistas angolanos, passou de aliado a concorrente da PT, nomeadamente em Cabo Verde e em Portugal, pelo que não resta outra alternativa senão o divórcio.
Como é natural, numa empresa estratégica para Angola, terá de ser a PT a deixar o lar. Teria sido preferível que o divórcio fosse amigável. Como não foi, não me surpreende o lavar de roupa suja em público, com cada uma das partes a defender os seus interesses. A parte angolana quer pagar o menos possível, e a PT quer receber o mais possível. É tudo uma questão de preço.
Como jornalista, só lamento que, com o divórcio, isto é, com a saída da PT, se acabem as notícias sobre os lucros fabulosos da Unitel... Neste caso, ao contrário do que diz o ditado popular, zangam-se as comadres, deixamos de saber as verdades...