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Opinião

Ficar na História

EDITORIAL

Meritocracia parecia um conceito que ia vencer, mas as oportunidades mantiveram-se apenas para os alinhados, ainda há concursos para instituições públicas que exigem ficha de filiação partidária, e muitos dos que poderiam ajudar o País, foram-se embora.

O presidente João Lourenço tem uma oportunidade única de ficar na História do País neste seu segundo mandato. Sem a pressão do partido para uma posterior reeleição, pode voltar ao modo reformista que utilizou nos dois primeiros anos do mandato anterior, e ficar para o futuro como o reformista de um sistema política que limita o crescimento das pessoas, que não distribui a riqueza, que defende o compadrio e o pensamento único como forma de ascensão social e profissional.

Parece que foi há muito tempo que o presidente entusiasmou os angolanos com coisas tão simples como andar em Luanda ao volante do seu carro, de ter manifestado intenção de mudar a sala do conselho de ministros para que não estivesse numa posição mais elevada, em que se deslocava apenas com dois ou três seguranças sem todo aquele show mediático, que não se afastava da população, que chamava as vozes diferentes para conversar, que nos fez acreditar que afinal "ninguém era suficientemente rico ou poderoso para não ser punido e que ninguém era pobre demais para não ser protegido".

Que parecia afinal possível que Angola tivesse instituições fortes, mais que o culto da personalidade que nos tinha alimentado durante dezenas de anos, que havia abertura suficiente para incluir os melhores e não apenas os do partido, que a sociedade não tinha afinal que ser permanentemente dividida entre os "nossos" e os "outros". Falou-se muito de nepotismo e bajulação, o presidente chegou mesmo a mostrar-se incomodado, mas hoje voltámos ao registo anterior. Podia, aliás, começar-se por aí. Porque é que todas as instituições públicas têm que ter dezenas de fotografias do presidente?

Meritocracia parecia um conceito que ia vencer, mas as oportunidades mantiveram-se apenas para os alinhados, ainda há concursos para instituições públicas que exigem ficha de filiação partidária, e muitos dos que poderiam ajudar o País, foram-se embora. Uma classe anónima de advogados, médicos, informáticos, engenheiros, bancários, técnicos médios e superiores, artistas, desportistas que pura e simplesmente, bazaram. Mas pior, criaram aversão ao regime, contestam e repudiam a terra que também é deles.

Cabe ao Presidente da República neste segundo mandato fazer esta reconciliação, interna e com os que estão fora, obrigar o partido a afastar-se do Estado, proceder às reformas necessárias para que os serviços básicos funcionem, exigir que o espírito democrático, de direito á diferença, seja uma prática diária de quem está a frente dos centros de poder.

Chegou o momento de pensar País e não apenas olhar para os interesses corporativos ou pessoais. João Lourenço pode ficar na história como reformador, mas tem que querer muito. Vai ser fácil? Claro que não! É possível? Claro que sim!