À medida que as economias africanas se fortalecerem o mercado musical será autossuficiente
O mercado da música deve funcionar como qualquer outro, entre a oferta e a procura, defende o autor da música "Ser Negro". Em entrevista ao Expansão, o primeiro músico a editar um álbum R&B em português defende que a indústria musical ainda tem um caminho longo para potenciar todo o talento que o País tem.
O público conhece o Gutto por ser um dos primeiros músicos a fazer R&B em português. Quando e como começa essa paixão pela música?
Começa bem cedo, a clássica estória do bebé que sentava os adultos todos na sala e fazia um show com a vassoura. Mas venho de uma longa linha de músicos e poetas, por isso acho que já é genético.
Está há muitos anos ausente dos palcos. É por algum motivo em específico?
Na verdade, o meu afastamento tem a ver com opções de vida e de carreira. A minha agenda profissional terminou, mas quando surge uma situação especial e excepcional em que posso matar saudades do palco, eu aproveito.
Cantou para os casais apaixonados no dia 14 de Fevereiro. Qual é a sensação passados estes anos todos?
Sou todo a favor da paixão e dos relacionamentos. Foi um show intimista, por isso um pouco diferente do que me habituei. Habitualmente, canto para públicos maio res, mas foi uma boa oportunidade para testar a minha flexibilidade.
É o primeiro músico a lançar um álbum de R&B em português?
Posso estar errado, mas parece- -me que sim. Dos primeiros a "rappar" em português e o primeiro a editar um álbum R&B em português. Sempre fui atrevido assim.
Durante a sua carreira musical esteve envolvido em vários projectos. Como surgiu o convite para integrar o grupo Black Company?
Tinha um primo integrante da primeira formação de BC, na altura eles apenas cantavam em inglês. E como eu tinha um bom nível de inglês, chamaram-me para escrever as letras, depois chamaram para ensaiar as letras que escrevia. No primeiro concerto que BC fez com as minhas letras eu ia como público. Mas à última hora eles sentiram-se sem confiança, obrigaram-me a subir ao palco e, desde aquele dia, nunca mais saí.
"Quieres Dinero" é uma das músicas de Boss AC com a sua participação. Como começou essa relação com Boss AC?
Já o conhecia dos concertos e das festas. Mas a nossa relação de amizade cimentou-se quando fomos ambos convidados para sermos formadores num projecto da União Europeia, para a educação e cidadania através da música. Passámos muito tempo na estrada, percorrendo o país de norte a sul, e nessa altura surgiu a ideia de formar a nossa produtora "NoStress Records".
Com 30, ou quase 30 anos, de carreira musical como avalia a música angolana?
Não sou professor para fazer avaliações, mas se há coisa que nunca faltou à nossa terra é talento. Agora, nem só de talento vive o sucesso, precisa de ser trabalhado, alimentado, acarinhado. A indústria musical ainda tem um caminho longo para potenciar todo o talento que temos.
O que é que mudou no mercado?
Não sou a pessoa mais indicada para responder a essa pergunta.
Qual é a sua opinião sobre o hip-hop e o R&B feito pela nova geração?
Não é do tipo que me faz baixar os vidros do carro e levantar o volume no máximo, mas tem coisas muito boas. Sou filho do boom bap, dos 90"s... isso não vai mudar. Questões geracionais, se calhar. Mas emoção é emoção, independentemente do estilo musical.
O que falta para que a indústria da música seja um contribuinte para o PIB em Angola?
Como qualquer indústria, deve criar riqueza e distribui-la. O mercado livre da música deve funcionar como qualquer outro, oferta/procura. O País deve distribuir riqueza suficiente para que as pessoas tenham de sobra para comprar um CD ou pagar o ingresso para concertos para que os artistas não dependam de subvenções estatais.
A internacionalização dos músicos angolanos, a maior parte das vezes, passa por Portugal. Como justifica isso?
É o passo lógico, a língua, a proximidade cultural, a comunidade Angolana em Portugal e a interação fácil e privilegiada com os artistas lusos. Portugal é um centro de convergência de artistas de toda a lusofonia e uma porta de entrada para a Europa. Faz todo o sentido.
Acha que os músicos angolanos exploram pouco os mercados africanos?
Acho que África é o futuro...
Leia o artigo integral na edição 763 do Expansão, de sexta-feira, dia 16 de Fevereiro de 2024, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)