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"Percebo que há muita desvalorização da língua materna cá em Angola"

ERNESTO MOAMBA- ESCRITOR MOÇAMBICANO

Escreve romance, poesia e literatura infantil e esteve recentemente em Luanda para apresentar o seu mais recente livro às crianças angolanas. O autor de "Abecedário que se fingiu de mudo" tem mais cinco livros na calha.

O "Abecedário que se fingiu de mudo" é o título do livro que traz para as crianças angolanas. Que conteúdos sugere o livro e, por quê esse título?

Acreditamos que é um título sugestivo para as crianças. Na verdade, tenho feito assim em todos os meus livros, faço o exercício de trazer livros impactantes. Primeiro pelo título e depois pelo conteúdo, sendo o mais essencial. O "Abecedário que se fingiu de mudo" é um livro infantil que traz várias questões que nós temos presenciado no nosso dia-a-dia. Porque percebo que ultimamente tendemos a distanciar-nos um dos outros. Nós já não temos aquele amor ao próximo. Há muita falta de empatia, muita desigualdade social. E são questões que me inquietam e, por isso, resolvi trazer isso em forma de livro infantil, como forma de educar as crianças, de lhes mostrar que eles se devem pautar por um caminho mais justo.

Trouxe para Luanda quantos livros?

Tinha pouquíssimos livros, porque tivemos um atraso técnico por parte da editora. Infelizmente não pude fazer a distribuição que gostaria. Tivemos muitos leitores no dia do lançamento. Foi um evento maravilhoso. Mas espero oportunamente poder trazer alguns livros para comercializar.

Porque escolheu Angola para trazer o seu livro?

Moçambique e Angola são países irmãos, porque têm uma relação de irmandade. Ambos se interligam por causa da cultura, da história. Penso que os dois países vivem momentos iguais, fazendo assim uma comparação mais profunda. E resolvi trazer o livro, primeiro, porque também fazia parte dos meus objectivos conhecer Luanda e Angola, assim como conhecer o povo, as suas falas, a sua língua. Também trouxe esta obra para mostrar aquilo que escrevo, para mostrar aquilo que é a minha temática, para incentivar as crianças angolanas a terem o hábito da leitura e do gosto pelo livro.

Acha que as crianças angolanas conseguem rever-se nesta obra?

Tento fazer o máximo possível em todos os meus livros. Primeiro, trazendo uma linguagem mais simples, conteúdos que envolvam quase todos os países de África. Na minha temática, tento falar sobre questões diárias do povo africano em geral, não somente de Moçambique. E essa questão, esse conceito faz com que os meus livros sejam mais abrangentes.

O facto de os livros esgotarem e terem mais pessoas interessadas em comprar significa alguma coisa para si?

Alguma tristeza por não poder corresponder às expectativas das pessoas. Digo com muita tristeza porque as pessoas estavam lá com muita vontade de ter o livro. Infelizmente, alguns tiveram o livro, outros não tiveram. Por outro lado, mostra que as crianças começam a ter interesse em ler. Penso que há uma preocupação dos pais em querer mostrar o lado bom da escrita ou do livro, que é algo muito carente. Por exemplo, em Moçambique são poucos os escritores que escrevem para as crianças e esse é um dos objectivos que me levou também a imergir na literatura infantil.

Não há valorização do livro infantil?

Ainda não há muita valorização da literatura infantil, no verdadeiro sentido, como gostaria. Então é mais um motivo para escrever, para mostrar que os livros também podem educar, os livros também podem fazer a criança ter um vocabulário diferente.

Acha que em Angola também há poucos escritores para as crianças?

Bem, nas conversas que tive durante a minha estadia aqui percebi que ambos os países passam pelas mesmas dificuldades. Penso que há poucos escritores que apostam na literatura infantil. Não dão muito valor, ainda inferiorizam este lado infantil. Mas esquecem-se de que "é de pequenino que se torce o pepino", como temos aprendido.

Tem a ver com os preços dos livros?

Eu, particularmente, vendo os meus livros mesmo a um preço promocional, agradável. Aqui em Angola vendi a 3.000 Kz. Penso é um preço justo que cada um pode adquirir.

Em países onde as pessoas estão preocupados em trabalhar para comprar pão, o livro não é prioridade.

Realmente, é algo que tenho tentado combater, porque além de escrever, também costumo fazer palestras nas escolas da minha cidade, Maputo. Trabalho com algumas escolas, principalmente as públicas, onde os pais têm dificuldades, eles não conseguem comprar livros. Tenho um clube de leitura, onde por cada fim-de-semana eu levo as crianças num parque, num jardim, para ler, para aprender a construir uma história. E isso é um trabalho muito importante, muito aplaudido em Maputo.

Disse que há poucos escritores para crianças. Como é que se incentiva a escrever para crianças?

Primeiro o escritor deve criar acções que possam estimular, e atrair as crianças, principalmente, a gostarem de ler. Digo que deveria ser obrigatório todo o escritor escrever um livro para crianças. Acho que se fizéssemos isso, ou partíssemos desse conceito, já teríamos muitos livros para crianças e já teríamos muitas com esse despertar de ler. Então, penso que os escritores devem escrever, devem fazer parcerias com as escolas, devem fazer parcerias com os ministérios que lidam com a educação, com a cultura, para a promoção desses livros.

Leia o artigo integral na edição 779 do Expansão, de sexta-feira, dia 07 de Junho de 2024, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)

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