Antigo funcionário da Sonangol e ex-futebolista acusado de corrupção na Suiça
Os actos sob grave suspeita seguem agora para a fase de julgamento - que arranca segunda-feira, 2, na cidade suiça de Bellinzona -, sendo que os principais lesados são a Sonangol e os cidadãos angolanos.
O processo judicial diz respeito às supostas relações corruptas entre a Trafigura e um facilitador angolano que, segundo a imprensa suiça, chama-se Paulo Gouveia Júnior. O antigo funcionário da Sonangol, um antigo médio-direito do Petro Luanda (no início da década de 1980) que chegou a ser presidente do mesmo clube, entre 2004 e 2007, foi acusado naquele país de ter recebido subornos de mais de 4 milhões de euros para entregar contratos a favor da Trafigura, empresa que terá lucrado ilegalmente, com estes negócios, 143,7 milhões USD. Em 2019, Gouveia, como era conhecido nos relvados nacionais, foi nomeado consultor para a área de engenharia do Tribunal de Contas, cargo que já deixou de exercer.
De acordo com a imprensa suiça, entre Agosto de 2009 e Julho de 2011, Paulo Gouveia Júnior, que chegou a ser PCA da Sonangol Distribuidora e, mais tarde, da Sonagás, recebeu cerca de 4 milhões de euros em 16 transferências da ConsultCo Trading Ltd, uma empresa sediada nas Ilhas Virgens Britânicas.
Outros 350 mil euros foram transferidos directamente por uma sociedade offshore controlada por Mariano Marcondes Ferraz (antigo funcionário da Trafigura, que chegou a ser condenado no Brasil no processo "Lava Jato" e que é um dos delatores neste processo), a Enelmer International LTD, em 10 de Julho de 2009, enquanto 604 mil USD foram supostamente entregues a Paulo Gouveia Júnior em numerário, de acordo com os relatos divulgados pela imprensa suiça.
Os pagamentos visavam garantir a assinatura de oito contratos de fretamento de navios e um contrato de abastecimento de combustível a favor da Sonangol Distribuidora. Como resultado destes subornos, a Trafigura terá obtido um lucro ilegal de 143,7 milhões de dólares, de acordo com os cálculos do Procurador-Geral da Suíça.
Os movimentos financeiros ilícitos eram efectuados através de uma entidade offshore criada pelo gestor e ex-atleta angolano, chamada "Wyland Group", que por sua vez era titular de uma conta bancária na sucursal de Genebra do Crédit Agricole (banco que actualmente se chama CA Indosuez), divulgou durante o mês de Novembro a plataforma de jornalistas "Public Eye".
Os actos sob grave suspeita seguem agora para a fase de julgamento - que arranca segunda- -feira, 2, na cidade suiça de Bellinzona -, sendo que os principais lesados em todo este processo são a Sonangol e os cidadãos angolanos. Este caso é também um exemplo dos interesses privados e corruptos, nacionais e internacionais, associados à importação de combustíveis
A acusação de 150 páginas, divulgada na segunda-feira, 25, descreve em pormenor a forma como os subornos foram alegadamente pagos e, pela primeira vez, associa de forma clara o falecido fundador e ex-director-executivo da Trafigura, Claude Dauphin, que terá exercido um papel central no esquema de corrupção.
Se for condenada, a Trafigura enfrenta uma multa máxima de 5 milhões de francos suíços (cerca de 7,5 milhões USD) e o reembolso do lucro ilícito dos referidos 143,7 milhões USD.
O Tribunal Penal Federal da Suíça agendou três semanas para o julgamento e indicou duas datas de reserva no final de Janeiro, se for necessário estender os procedimentos. A Trafigura já disse publicamente que rejeita as acusações.
A multinacional suiça, que na década de 2010 se associou em Angola a Leopoldino do Nascimento, o General "Dino", e dessa forma expandiu as suas operações comerciais no País, chegou a ter o monopólio de importação de combustíveis, processo que foi decidido sem a realização de um concurso público que permitisse escolher a opção com melhor custo/benefício.
São também desconhecidas iniciativas da Procuradoria-Geral da República (PGR) em território nacional no sentido de investigar e responsabilizar criminalmente o gestor angolano acusado na Suiça e outros eventuais envolvidos neste tipo de práticas no seio do Grupo Sonangol. De acordo com informações recolhidas pelo Expansão, Paulo Gouveia Júnior, que era próximo de Manuel Vicente, está actualmente radicado em Portugal.
Leia o artigo integral na edição 804 do Expansão, de sexta-feira, dia 29 de Novembro de 2024, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)