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Empresas & Mercados

Dentro de duas décadas o país pode substituir parte das exportações de hidrocarbonetos por hidrogénio verde

Transição energética

Aquilo que por agora parece impensável pode tornar-se uma realidade dentro de uma década ou duas, é o que pensa Filipe Vasconcelos, engenheiro sénior da S317 Consulting, e é o que pensa também o governo alemão

O Presidente João Lourenço recebeu muito recentemente o novo embaixador da Alemanha em Angola, Stefan Traumann, na Cidade Alta. Além da apresentação de credenciais e dos habituais cumprimentos protocolares ao Presidente da República, o embaixador alemão disse aos jornalistas que o seu governo pretende criar um gabinete em que empresas alemãs venham a cooperar com o Governo angolano na área da energia de hidrogénio.

O projecto alemão é vasto e inclui todas as formas de renováveis. A criação de parcerias entre empresas alemãs e o Governo angolano é mesmo uma prioridade da sua missão em Angola, sublinhou o novo embaixador.

Filipe Vasconcelos, engenheiro sénior da S317 Consulting, uma empresa portuguesa que está no mercado angolano há largos anos e que é especialistas em transição energética, alterações climáticas e água - trabalha, aliás, com o Ministério da Energia e Águas (Minea) -, vai mais longe, considera que dentro de uma ou duas décadas o hidrogénio verde pode ser uma relevante indústria exportadora do país.

"Há vários países que se estão a posicionar como grandes exportadores de hidrogénio para os mercados do norte da Europa" e Angola pode ser um desses países, afirmou. Dito isto, acrescentou que "Angola pode substituir uma parte da sua exploração de combustíveis fósseis por hidrogénio verde".

No país ainda tão profundamente dependente dos hidrocarbonetos e sem um plano estratégico para as renováveis, tudo isto se assemelha a uma quase impossibilidade ou mesmo uma inutilidade.

No entanto, o Governo vai sinalizando, aqui e ali, que Angola é um país alinhado com o contexto global, e fê-lo através das palavras do Presidente João Lourenço na cimeira do clima de Glasgow, a COP26.

"Angola reduz a emissão de gases de efeito estufa em 50 mil toneladas por ano e poupa cerca de 190 milhões de dólares em combustíveis fósseis, com a construção de uma central solar fotovoltaica com capacidade para produzir 50 megawatts, no Caraculu, município da Bibala, Namibe", é notícia recente do Jornal de Angola.

"A poupança dos 190 milhões de dólares ocorre ao longo de 23 anos, o tempo útil da central fotovoltaica, estando ligada à substituição do consumo de 18 mil metros cúbicos de gasóleo por ano, pelo de energia solar, de acordo com informações obtidas no acto de assinatura do acordo, ontem, em Luanda, pela Sonangol, a ENDE e a RNT para a construção do projecto.
O ministro dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás, Diamantino Azevedo, que avançou estes dados, disse que a execução do projecto tem um custo previsto de 42 milhões de dólares, e que, depois de arrancar, em Dezembro, a empreitada fica concluída no quarto trimestre de 2022, comportando uma área de produção e uma subestação para fornecimentos iniciais ao Namibe e Huíla", completa a notícia.

"Angola precisa de um plano claro e ambicioso"

Para o engenheiro Filipe Vasconcelos, licenciado em Engenharia na Universidade Nova de Lisboa, com MBA na London Business School e Mestrado na Universidade de Paris, "Angola tem, desde logo, uma capacidade endógena de geração de energia renovável absolutamente extraordinária e muito diversificada" - e falamos de energia hídrica, éolica, solar, um "mix energético".

É real, quisemos saber. "Não, é potencial", disse-nos o engenheiro especialista em Energia.

E esse potencial é ainda mais amplo. "Angola tem o potencial de ser um player regional no que têm a ver com as energias renováveis", afirmou Vasconcelos, "abrindo caminho à inovação e é uma forma de se posicionar no mercado mundial", acrescentou.

Ainda que, e na sua opinião, "o fim anunciado do petróleo está largamente exagerado", a verdade "é que estamos a falar de um sector que têm de se preparar com 20 ou 30 anos de antecedência, e o momento para o fazer é agora", afirmou Filipe Vasconcelos, também porque os bancos de desenvolvimento e as instituições internacionais estão mais preparadas para o fazer.

Angola "precisa de um plano ambicioso" de energia eólica, mas também mais de energia hídrica, que tem a capacidade de grande mobilização de mão-de-obra e de mobilizar por arrasto o resto da economia.

Quanto à notícia recente da construção de novas centrais térmicas, o engenheiro considera um "passo ao lado" numa altura em que é relativamente fácil dar passos em frente e começar a electrificar pequenas áreas rurais com o recurso a energias limpas.

"A electrificação rural de solar ou fotovoltaico ou eólico para fornecer a energia a pequenas localidades" é uma possibilidade que contribuiu para mais saúde e segurança e maior educação e salubridade.

Quanto a uma eventual falta de quadros, o engenheiro português argumenta que "é uma indústria onde se aprende muito rápido e onde é fácil capacitar pessoas para trabalhar, por exemplo, trabalhar num complexo de energia solar é mais simples do que trabalhar numa refinaria ou numa plataforma".

Angola aposta na produção de 800 megawatts de energias renováveis num futuro próximo, "é uma boa bandeira para começar, mas é preciso haver mais", disse-nos Filipe Vasconcelos.

"Há apetite para o investimento nesta área, o que é importante é haver uma clarificação institucional em termos estratégicos da parte do governo e em termos regulatórios. Um investidor o que mais quer é ter previsibilidade do seu retorno, e, portanto, uma das ferramentas que é importante reforçar é o Governo ter uma linha estratégica bem definida e estável e que haja do ponto de vista institucional uma regulação do sector" e com isto "os investidores entram", concluiu Filipe Vasconcelos.