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Grande Entrevista

"Muitos vêem os catadores a mergulhar nos contentores de resíduos e não associam à actividade, mas à fome"

ÉRICA TAVARES | COORDENADORA TÉCNICA DA ECOANGOLA

Numa altura em que Angola declara guerra aos plásticos de uso único, a bióloga ambientalista aponta as barreiras enfrentadas pela indústria da reciclagem, impostas pelo actual modelo de gestão de resíduos sólidos no país. A falta de infraestruturas é a primeira frente de batalha nesta guerra, já declarada. Mas há soluções que passam por combater a pobreza e valorizar os catadores, passos essenciais para a construção de um modelo de gestão mais sustentável e inclusivo.

Recentemente, o Executivo aprovou o Plano de Acção Nacional para a Eliminação Progressiva dos Plásticos de Uso Único (PLANEP). O que este plano traz para as questões ambientais, nomeadamente a questão do plástico?

Nós, como cidadãos, temos observado a grande quantidade de resíduos que a nossa cidade, Luanda, e o país, de forma geral, têm produzido, sem que haja um tratamento adequado. Em qualquer rua encontramos plástico, nas praias, nas valas de drenagem, nos solos e, certamente, também o consumimos de diferentes maneiras. É uma preocupação enorme para as pessoas e tem impacto directo sobre a biodiversidade. Este plano surge num momento muito importante, pois é necessário promover uma mudança. Trata-se de uma transição indispensável e demonstra a vontade do Governo em alterar esta realidade. Agora, aguardamos para ver o que, de facto, será executado.

Apesar da vontade governamental, nota-se algum cepticismo da sua parte. Porquê?

Porque somos muito bons a criar planos e estratégias, mas, muitas vezes, a parte da execução fica aquém. Ainda assim, acredito que é uma boa oportunidade para o Governo se aliar às organizações não-governamentais, às empresas - tanto as produtoras de plástico como os espaços comerciais, que são os maiores promotores desse material - e, certamente, também às comunidades. Quando olhamos para os nossos mercados, o plástico é um dos produtos que, mesmo que não pretendamos comprar, acabamos por levar para casa, porque está presente em tudo, até num simples monte de tomate, por exemplo. Há, portanto, uma necessidade muito grande de sensibilizar a população em diferentes níveis. Mas, como disse, é um começo e devemos apoiar para que o plano seja efectivamente implementado.

No vosso raio-x ao PLANEP, quais são as principais debilidades e os pontos fortes identificados?

Acredito que uma das debilidades é, por vezes, a falta de realismo. Uma das componentes principais do plano é a educação ambiental e a implementação faseada de infraestruturas, o que considero um ponto positivo. A estratégia fala em faseamento, mas é preciso considerar que poderá haver alguma resistência social. As empresas produtoras podem manifestar descontentamento; por isso, é necessário criar mecanismos de transição que não prejudiquem a economia e que, pelo contrário, gerem novas oportunidades. É também fundamental investir em comunicação e sensibilização.

As escolas também são parte importante...

A comunicação social, em particular, tem uma grande responsabilidade e deve promover a educação ambiental. O Ministério da Educação e o do Ensino Superior precisam incluir o tema nos currículos escolares. Este plano representa uma mudança importante agora, mas os resultados serão geracionais, se for bem executado. Portanto, há, sim, pontos positivos, mas também aspectos a melhorar. A sociedade civil está aberta a tornar-se aliada principal para transformar este plano em realidade. Afinal, esta é uma das nossas maiores preocupações: a saúde pública, que já é um grande desafio e tende a agravar-se.

Este plano traz uma forte componente educativa. Como deve ser implementada essa estratégia de comunicação e educação cívica?

Devemos considerar diferentes grupos-alvo. Primeiro, as crianças, e aqui penso no longo prazo, embora, mesmo a curto prazo, elas tenham um papel fundamental como grandes fiscalizadoras, pois influenciam e pressionam positivamente os pais. Vemos isso em vários projectos da EcoAngola. Ou seja, a longo prazo, essas crianças deixarão de ser parte do problema. É preciso também envolver os jovens e estimular a sua criatividade por meio de projectos e soluções inovadoras. As organizações não-governamentais são grandes aliadas e têm desenvolvido um trabalho importante em todo o País.

De forma geral, nota uma maior consciência ambiental entre os angolanos?

Creio que sim. Sou optimista, embora tente não ser irrealista, reconheço que ainda há muito por fazer. As igrejas têm um papel essencial: moldam valores e po dem ajudar a disseminar a mensagem de que precisamos de uma sociedade mais limpa. A mudança deve acontecer de forma conjunta, um passo de cada vez.

Leia o artigo integral na edição 849 do Expansão, de sexta-feira, dia 24 de Outubro de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)

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