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Grande Entrevista

"A ideia de que os programas são desenhados para A, B ou C faz parte do passado"

LUZAYADIO SIMBA, PCA DO FUNDO DE GARANTIA DE CRÉDITO

O acesso ao crédito continua a ser referido como uma das principais dificuldades dos empresários. Foi por isso que o Estado resolveu criar uma entidade para agilizar a questão das garantias públicas e, dessa forma, fomentar o surgimento de novos empreendedores. Mais de 10 anos depois da criação do Fundo de Garantia de Crédito (FGC), os objectivos parecem longe de terem sido alcançados.

A economia angolana continua a depender basicamente de um único sector e a diversificação da economia, embora esteja a acontecer, tarda a dar sinais de maior consistência. Dentro da experiência adquirida pelo FGC nos últimos 10 anos, quais são as principais dificuldades que afectam os empresários e empreendedores nacionais?

Na maioria dos casos, para além das questões burocráticas, a principal dificuldade é a constituição dos próprios projectos. A proposta em si, a concepção. Essa é a grande dificuldade que os nossos promotores têm, sobretudo os de pequena dimensão. Os de média dimensão já trazem outra bagagem, alguns já têm consultores, mas isto não acontece nos micro e pequenos empresários. Nestes casos, a gestão é quase sempre familiar, muitas vezes nem conseguem separar o dinheiro do negócio, do dinheiro da família. Temos de ajudar os pequenos empresários a estruturar os seus negócios. A capacitação do nosso empresariado é incontornável.

No último relatório e contas disponível (2021), o FGC reconhece que lida com elevadas taxas de crédito malparado (mais de 40%). Depois o número referido publicamente baixou para os 30%. São números muito elevados, sendo uma questão que afecta toda a banca nacional, com sérios efeitos ao nível da credibilidade do sector. Por que razão os níveis de malparado são tão elevados?

Eu olho para a questão do malparado em duas vertentes. A primeira vertente é económica. Como é do domínio público, grande parte da nossa carteira é constituída pelos projectos do Angola Investe. Que começou em 2012. Dois anos depois, na altura em que os projectos estavam a começar a ser implementados, o País entrou numa situação difícil, numa crise económica e financeira que se arrastou até há bem pouco tempo.

Ainda vivemos as consequências desse período.

Exacto, tivemos esse azar e nós não podíamos abandonar os promotores. O FGC teve de estar ali para ajudar, reestruturando os créditos e as garantias e a reforçar o acompanhamento de proximidade. Também é verdade que temos de melhorar a análise e o rigor na avaliação do risco.

O malparado está muito associado a uma percepção de permeabilidade na forma como o crédito é concedido. A sensação que fica é que, sem os conhecimentos adequados, as coisas não avançam.

Nós estamos aqui a tentar colmatar isso com a capacitação dos nossos quadros e com a melhoria da avaliação do risco. A situação económica do País foi agravada com a pandemia. Julgo que os níveis que temos hoje poderiam ser piores se não houvesse essa intervenção com algumas reestruturações, com medidas para perceber melhor os promotores. Isso fez com que os níveis não fossem mais alarmantes. Há uma redução do malparado. Alguns projectos estavam inoperantes apenas porque ficaram sem fundo de maneio, por exemplo.

Ou seja, na vossa opinião, eram iniciativas economicamente viáveis mas que precisavam de melhorar ao nível da gestão corrente.

E o FGC, juntamente com os bancos, reavaliou os projectos, que foram reestruturados. Em alguns casos aumentamos a nossa exposição. Muitos estão a funcionar e têm estado a melhorar o seu desempenho.

A maioria dos apoios canalizados pelo FGC vem de programas públicos, como o Angola Investe. Quando esta iniciativa foi anunciada, em 2012, parecia demasiado voluntarista e apareceu em período eleitoral, o que levanta algumas dúvidas sobre os reais objectivos. Daqui podem também surgir os problemas de compliance, de risco elevado. Também identifica casos deste tipo entre os projectos com crédito malparado?

Bom, eu não olharia a questão por essa vertente eleitoralista. Se assim fosse não teríamos os resultados que temos hoje. Não teríamos.

Pode citar alguns casos de sucesso ao abrigo do Angola Investe?

Uma parte do aumento da produção interna está ligada a esse programa. E temos grandes exemplos. Os ovos que consumimos no País são fruto do Angola Investe. Ninguém pode dizer que foi apenas um programa eleitoralista. Temos aqui o caso da Hydris, é uma indústria que produz. Outro caso é a Nova Agrolíder. E como estes temos muitos outros exemplos. 70 a 80% dos produtos que estão nas nossas mesas têm alguma ligação ao Angola Investe.

No geral, a sociedade não atribui todas essas qualidades aos programas do Governo.

O que é que acontece? Quando não se publicitam os resultados dos programas do Executivo, permite-se que se faça uma má avaliação. Passa-se a percepção de que não se está a fazer nada ou que esses programas não têm resultados palpáveis. O que não é verdade. O Angola Investe não foi um programa falhado, pelo contrário, está a dar de comer aos angolanos e criou vários empregos. Agora, é bem verdade que alguns projectos financiados não tiveram êxito. Nesses casos, os bancos accionaram as garantias e o FGC, enquanto ente público, tem estado a assumir a sua responsabilidade.

(Leia o artigo integral na edição 719 do Expansão, desta sexta-feira, dia 07 de Abril de 2023, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)