"A retirada da licença de corretagem aos bancos vai acabar com conflitos de interesse na Bolsa de Valores"
Maurício Airosa, presidente da Madz Global, a primeira correctora a ser constituída em Angola, fala sobre o surgimento do mercado de acções, sobre o interesse de correctoras e investidores estrangeiros em entrar para o mercado angolano e sobre as vantagens da transição que culminará com a saída dos bancos enquanto intermediários financeiros até final do ano.
A CMC e o BNA decidiram retirar a licença de intermediação financeira e o estatuto de membros BODIVA aos bancos comerciais a partir de 31 de Dezembro deste ano. Em termos práticos os bancos deixam de ter domínio do mercado já que vão deixar de comprar títulos para a carteira de clientes. Que impacto terá esta medida no mercado?
Nós como operadores do mercado e como intermediários financeiros temos o conceito que uma bolsa é constituída pelos seus corretores, distribuidores e demais intermediários financeiros. Angola passou por um momento em que ocorreu o inverso e agora volta à normalidade.
Os bancos chegaram a dominar quase 100% das transacções e dos clientes do mercado de capitais. As corretoras queixavam-se que havia concorrência desleal. É a isso que se refere?
Sim! O surgimento do mercado de capitais trouxe apetite para o surgimento de vários players, mas no final foi a banca a promover e a dominar as negociações na BODIVA. Nós constituímos a corretora no mesmo ano do surgimento da BODIVA e a nossa expectativa era que aparecessem outras corretoras.
Num universo de 27 membros BODIVA existem apenas duas corretoras. Porquê?
Observamos a evolução dos monopólios ou conglomerados financeiros. Os bancos confinaram-se dentro da BODIVA e do próprio sistema financeiro e perdeu-se a grande oportunidade do surgimento de mais correctoras. Hoje somos apenas três.
Qual o impacto da saída dos bancos da intermediação financeira?
A saída dos bancos ajuda a promover o surgimento de outras corretoras. Do ponto de vista do negócio, a saída dos bancos vai aumentar o volume de negócios das corretoras e a redução do monopólio por parte dos bancos. Ajudará também o mercado a modernizar-se, ou seja, a modernização e evolução dos serviços do mercado de capitais. O que por sua vez vai trazer maior capilaridade para permitir a execução de ordens dos clientes menos aforrados.
É o fim do domínio dos bancos nas operações na bolsa de valores angolana?
A medida permitirá a evolução do mercado e garante o acesso dos investidores aos distintos produtos financeiros. Era necessário resolver esta questão para reduzir a concentração excessiva de poder dos bancos, e para isso foi necessário dar preferência de atribuição das operações a intermediários financeiros como corretoras, distribuidoras e outros agentes de intermediação, para que tenhamos um sistema financeiro mais saudável.
Com grande poder vêm grandes responsabilidades. A CMC vai aumentar as acções de supervisão e fiscalização junto das correctoras.
Foi criado o CSR que é o Conselho de Supervisão do Sistema Financeiro, que vai melhorar as sinergias informativas entre os diferentes reguladores. Esta medida vai ajudar a mitigar os riscos no sistema financeiro. Só teremos todos a ganhar. Tudo isso vai criar maior confiança para os investidores. Este é um ponto crucial.
Os títulos de dívida pública eram, até ao início do ano, o produto mais procurado pelos investidores que querem proteger o seu dinheiro da desvalorização e do efeito da inflação sobre o seu poder de compra. Mas muitos queixam-se dos conflitos de interesse dos bancos.
O surgimento de mais corretoras licenciadas vai criar concorrência saudável no mercado, vai promover melhorias dos serviços prestados ao cliente final, o que do nosso ponto de vista trará mais investidores para a bolsa de valores.
Os bancos são o maior investidor do mercado. De acordo com o BNA quase 40% dos activos dos bancos estão em títulos de dívida pública. Os bancos vão manter-se como clientes?
O dinheiro dos bancos vem dos depósitos dos seus clientes, o que lhes dá a possibilidade de concluir mais ordens já que têm capacidade para trazer grandes poupanças e liquidez para o mercado. Claro que para as corretoras ter os bancos como clientes vai proporcionar uma maior dinâmica no mercado de capitais.
(Leia o artigo integral na edição 672 do Expansão, de sexta-feira, dia 29 de Abril de 2022, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)