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Grande Entrevista

"Não é possível uma economia ser 100% alavancada pelo crédito, isto é insustentável"

FRANCISCO GARCIA DOS SANTOS, PCA DA INDEPENDENT FINANCE ADVISORS

O CEO da Independent Finance Advisors explica o processo de recapitalização do Banco Económico. Diz que o novo dono do banco são os subscritores do Económico - Fundo de Capital de Risco e não a sociedade que gere o fundo. Sobre o mercado de capitais, explica que com o arranque do mercado da bolsa de acções finalmente Angola tem bolsa de valores. Aponta o caminho aos empresários e analisa o sistema financeiro angolano.

A 9 de Junho, foi oficialmente inaugurado o mercado de bolsa de acções em Angola, com a chegada à Bodiva das acções do BAI. Nesta quinta-feira, foram admitidas as acções do Caixa Angola, a segunda empresa cotada em bolsa. Entretanto, ambas as operações não foram realizadas para suprir as necessidades de financiamento destas empresas, mas pelo programa de privatizações. O que falta para que as empresas comecem a encarar o mercado de capitais como uma alternativa de financiamento ao crédito bancário?

É importante que se perceba que a dinamização do mercado de capitais não é um luxo, mas uma questão de sustentabilidade do sistema financeiro. Essa é a razão fundamental da dinamização do mercado de capitais. Não é possível uma economia ser 100% alavancada pelo crédito. Isto é insustentável, isto vai sobrar para alguém, como é óbvio. O País precisa de crescer a dois dígitos para alcançar o desenvolvimento e, para tal, tem de diversificar a economia.

Mas, apesar dos programas do governo, falta financiamento. Como resolver este problema?

Fala-se muito de crédito. E agora até se fala muito mais, porque temos estas linhas de financiamento, através do crédito, para sectores como a habitação e o sector produtivo. A política monetária está numa fase interessante, com linhas de financiamento a taxas de juros bonificadas de 7% para quem deseja comprar habitação e 10% para promotores dos projectos imobiliários.

Mas, mesmo assim, as pessoas e empresas queixam-se de dificuldades no acesso ao crédito. O que se passa?

Só os sectores elegíveis para beneficiar destas linhas de financiamento é que tendem a crescer. Fala-se muito de crédito, só que ninguém diz que, para ter acesso a crédito, é necessário ter capitais próprios. Não há acesso a linhas de financiamento bonificadas nem para o sector produtivo nem para o sector da habitação se o empresário não tiver capitais próprios.

Explique melhor?

O ponto chave que quero passar é que só há crédito para as empresas se estas tiverem capitais próprios. Sempre que se falar de crédito ao sector privado é necessário perguntar qual é a proporção de capital próprio necessário para ter acesso ao crédito bancário. Isto pressupõe sempre capitais próprios. É importante que o empresário saiba que, para financiar um projecto, tem de ter uma percentagem do seu dinheiro, capitais próprios, normalmente entre 25% e 40% do valor necessário para o projecto.

Existe o Prodesi e vários programas do governo, mas os empresários queixam-se das dificuldades no acesso ao crédito. Estes programas não resolvem o problema base?

Quanto é que você vai meter do seu dinheiro? Essa pergunta é sempre fundamental colocar aos empresários, isso contribui para a consciencialização de que não é possível uma economia financiar-se e desenvolver-se somente com crédito bancário, este é o contributo dos jornalistas para a dinamização do mercado.

Está a dizer que o recurso ao crédito tem vantagens e desvantagens?

A grande vantagem é que acelera o crescimento. A grande desvantagem é que se as coisas correrem mal põe problemas de solvência graves ao sistema financeiro. Enfim, já passámos recentemente crises no sistema financeiro mundial para perceber também as desvantagens deste sistema.

Em que fase da vida das empresas o mercado de capitais é fundamental e ajuda a criar track record para ter facilidade no acesso ao crédito?

Para haver crédito bancário as empresas têm de ter solvência, ou seja, têm de ter capitais próprios mínimos num determinado nível e ajustados ao volume de negócios que vão fazer. É esta parte, obviamente, que não é financiável pelos bancos. Os bancos obviamente não dão crédito a 100% às empresas. Isto não faz sentido. É nos capitais próprios onde realmente o mercado de capitais pode entrar.

Disse que é insustentável uma economia ser 100% alavancada pelo crédito. Quais as proporções de financiamento das empresas via crédito e via mercado de capitais nos países desenvolvidos ou nos que estão a dar passos firmes rumo ao desenvolvimento económico?

Tenho dados desactualizados, mas, grosso modo, nos países anglo-saxónicos a estrutura de financiamento tem a seguinte estrutura: três quartos é proveniente do mercado de capitais e apenas um terço é proveniente do crédito bancário. Queremos alcançar o patamar da África do Sul, que é claramente uma economia mais pró-mercado de capitais. Tal como todos os países anglo-saxónicos, a África do Sul tem 75% do financiamento proveniente do mercado de capitais.

(Leia o artigo integral na edição 694 do Expansão, de sexta-feira, dia 30 de Setembro de 2022, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)