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Grande Entrevista

"Um país não se desenvolve com multinacionais. É com micro, pequenas e médias empresas"

MADY BIAYE, EX-REPRESENTANTE DO FUNDO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A POPULAÇÃO

Mady Biaye, que terminou a missão no início de Junho após quase quatro anos no país, considera que Angola deve apostar na juventude e em iniciativas privadas que tragam qualidade às populações, para que o potencial demográfico não se transforme em problema, numa altura que o desemprego não pára de crescer.

Terminou no início de Junho o seu mandato em Angola como representante do Fundo das Nações Unidas para a População (UNFPA). Da experiência que teve, como avalia a sociedade angolana?

Somos uma população muito dinâmica e jovem e com um grande potencial. Temos mais ou menos uma média de um milhão e quatrocentos mil nascimentos por ano e assim deve permanecer até 2030. Isso faz com que tenhamos a base da pirâmide etária larga, significa que existe um grande peso em termos de pressão nos sectores sociais, porque os bebés não produzem. Consomem, mas não produzem. Em termos de saúde, como vamos fazer para que estes bebés nasçam em boas condições.

Em que sentido?

Quando esses bebés vão começar a entrar na idade pré-escolar, teremos escolas suficientes? É um desafio muito grande para qualquer país. E também, quando terminam a formação, têm de ser bem equipados para entrar na vida produtiva. E aí temos outras discussões. O Estado não é um empregador. O Estado não é para dar emprego, o Estado cria condições para que se criem iniciativas, sejam na função pública ou no sector privado. O desafio é tão grande, anualmente nascem muitas crianças, muitas pessoas entram na força de trabalho. Para Angola calculamos que sejam 700 mil cada ano que entram no mercado de trabalho. Isso cria um desafio bastante grande para o País.

Diz que o Estado não cria empregos, mas em Angola o Estado ainda é o maior empregador...

Não deveria ser assim. Isso é papel do sector privado, da iniciativa privada. Quando houver a diversificação económica, uma economia forte, isso vai-se resolver, porque existem muitas oportunidades. É preciso formar as pessoas e também ajudar a mudar de mentalidade. O sector privado somos todos nós. Se condições forem criadas para a iniciativa privada podemos organizar os jovens. Por exemplo, o agronegócio... mas o mais importante é saber que um país não se desenvolve com multinacionais. O país desenvolve-se com micro, pequenas e médias empresas locais. Dentro de 10 anos as pessoas mais ricas desse país vão ser as pessoas que desenvolverem negócios. Em Angola tudo cresce.

Este discurso de que em Angola tudo cresce, que é rica, já leva anos e o País continua como está. O que falta para transformar-se num facto?

Isso depende dos angolanos. Por exemplo, se as pessoas não valorizam o trabalho da terra vai ser difícil. Quem empreender nesta área terá muito mais hipóteses de sucesso nos próximos anos, em termos financeiros e de negócios. Porque é um sector com muito mais potencial real do que os outros. O Governo tem de ajudar a juventude a entender bem isso. Formá-los e prepará-los nesta área. Tem também serviços. O potencial existe.

Mas é preciso transformar este potencial em coisas concretas...

Sim. Mas o trabalho tem de ser feito. Por exemplo, as 700 mil pessoas que entram todos os anos na força de trabalho, quando chegam a esta fase já encontram pessoas desempregados aí. Milhões de pessoas desempregadas. É difícil ajudar e a melhor maneira é com a iniciativa privada. E os jovens têm de entender isso. No meu país [Senegal] pessoas que fazem mestrados em Inglaterra, Estados Unidos, quando regressam, fazem negócios na agro-pecuária. Aqui pode ser igual.

A pressão social resultante da pirâmide etária larga na base, muitos nascimentos e população jovem, condiciona o desenvolvimento do País?

Sim, condiciona. Porque o potencial, se não se transforma, não se realiza, transforma-se em peso. Por exemplo, se as pessoas não seguirem uma trajectória positiva na escola e caírem para outro lado, cria-se um problema. Como as crianças que vemos hoje nas ruas, criam muitos problemas ao Estado, que tem de fazer alguma coisa, porque estas crianças fazem parte da população. Isso é um desafio que todos os países do mundo conhecem. Por isso, é que, quando falamos da questão do dividendo demográfico, se a pressão continuar, o Estado, que é responsável pelo bom funcionamento da sociedade, não vai conseguir. Queremos ter uma população de qualidade.

Leia o artigo integral na edição 782 do Expansão, de sexta-feira, dia 28 de Junho de 2024, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)

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