A exploração artesanal de recursos minerais é necessariamente contrária aos interesses económicos do Estado?
Nós concordamos que a exploração ilegal e desordenada dá uma má imagem para o sector, mas, sabemos igualmente que o Estado angolano investe muito nos órgãos de defesa e segurança, logo, é justo exigirmos que estes órgãos cumpram o seu papel. O Código Mineiro, artigo 177º "Requisitos de acesso à mineração artesanal" no seu ponto 1, é claro quando diz que "Os direitos mineiros para a produção artesanal apenas podem ser atribuídos a cidadãos nacionais maiores de dezoito anos."
No início deste mês assistimos com muito agrado a primeira "Conversas do Economia 100 Makas" que teve como orador principal o ministro dos recursos minerais, petróleo e gás. O evento, que foi uma verdadeira aula magna sobre o sector, deu aos participantes acesso a muita informação sobre o seu passado, presente e futuro. Porém, quando questionamos o ministro sobre as dificuldades que os cidadãos têm de criar cooperativas, tal como previsto no actual Código Mineiro (Lei 31/11 de 23 de Setembro), ouvimos que o Executivo dá preferência à criação de empresas, já que a exploração artesanal atrai estrangeiros, cria uma má imagem para o sector. Ora bem, neste espaço vamos tratar de desmistificar essa percepção.
Para se resolver um problema é preciso primeiro admitir que ele existe e como tal precisa ser resolvido. Neste caso em particular, o problema resulta no facto de que as grandes mineradoras mundiais estarem mais interessadas nos grandes projectos intensivos em capital, sem serem capazes de absorver a mão de obra, pouco qualificada, hoje disponível no mercado. Soma- -se a isso a ausência de uma indústria de apoio a este sector.
A exploração artesanal desordenada, acontece dada a incapacidade da governação materializar a visão do Presidente João Lourenço expressa na sua mensagem sobre o Estado da Nação em 2019 que passamos a citar "reorganização e legalização das cooperativas de diamantes, visando a sua transformação em empresas de exploração semi-industriais". Nesta visão, primeiro é preciso criar cooperativas para depois transformá-las em empresas semi-industriais. Isso porque existe uma enorme dificuldade para as empresas se financiarem junto da banca comercial. Como se sabe a exploração mineira é uma actividade de risco, logo, no actual contexto caracterizado por uma volatilidade da moeda local, não acreditamos que os bancos comerciais estejam dispostos a arriscar fundos para este tipo de iniciativa.
Nós concordamos que a exploração ilegal e desordenada dá uma má imagem para o sector, mas, sabemos igualmente que o Estado angolano investe muito nos órgãos de defesa e segurança, logo, é justo exigirmos que estes órgãos cumpram o seu papel. O Código Mineiro, artigo 177º "Requisitos de acesso à mineração artesanal" no seu ponto 1, é claro quando diz que "Os direitos mineiros para a produção artesanal apenas podem ser atribuídos a cidadãos nacionais maiores de dezoito anos." Sabemos que no tempo da guerra não era possível controlar o acesso às zonas de exploração, mas, passados quase que 22 anos de paz, qual é a dificuldade? O Executivo tem a obrigação de responder esta pergunta.
O Código Mineiro diz no artigo 170º (Integração Económica) que "O ministério da tutela deve criar condições para a integração dos mineiros artesanais em cooperativas ou outras formas organizadas de actuação, que resultem num melhor aproveitamento dos recursos naturais em benefícios das populações, de harmonia com a política do Poder Executivo para o sector mineiro." Apesar da responsabilidade ser do ministério de recursos minerais, petróleo e gás, acreditamos que este esforço para ser bem-sucedido necessita do apoio de outros departamentos ministeriais. Como criar condições para a integração dos operadores artesanais em cooperativas?
Tudo começa com a definição das zonas de exploração. O Código Mineiro diz no artigo 173º ponto 2 que "As áreas consideradas adequadas para a mineração artesanal são apenas aquelas cujas características geológicas não permitam a realização da actividade mineira em escala industrial." Dentro do actual modelo de governação do sector mineiro, a Agência Nacional de Recursos Minerais poderia interagir com as administrações locais no processo de atribuição de concessões. Este processo será sempre susceptível de gerar corrupção e discriminação partidária, favorecendo membros do partido governante, ou mesmo regional. É preciso ter mecanismos de fiscalização e denuncia, já que se isso for aceite como "normal", poderá gerar tensões sociais. Uma vez atribuída a concessão e organizados os operadores artesanais em cooperativas, deve ser criado junto da banca nacional um mecanismo de financiamento destas organizações. Este financiamento pode ser condicionado, por ex., a obrigatoriedade dos membros das cooperativas aderirem as normas de protecção ambiental, normas de segurança e higiene no trabalho, responsabilidade fiscal, literacia financeira e poupança. As acções de formação podem ser feitas via INEFOP ou privados. É preciso encorajar os operadores artesanais a reinvestirem parte dos seus ganhos em actividades mais sustentáveis como a aquicultura, agricultura e pecuária, uma vez que os recursos minerais não são renováveis.
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