Saltar para conteúdo da página

Logo Jornal EXPANSÃO

EXPANSÃO - Página Inicial

Opinião

Cisne negro: dívida explosiva

CONVIDADOS

O termo Cisne Negro foi popularizado pelo livro "The Black Swan", de Nassim Nicholas Taleb. Trata-se de um evento imprevisível e de consequências potencialmente graves. Caracteriza-se pela sua extrema raridade, impacto severo e insistência generalizada de que as suas consequências eram óbvias em retrospectiva. Qual será o próximo Cisne Negro?

Tudo começa com a política monetária implementada pelos bancos centrais, após a crise iniciada pela falência do banco de investimento norte-americano Lehman Brothers, em Setembro de 2008. Tal política consistiu na compra de activos financeiros pelos bancos centrais directamente no mercado secundário por contrapartida da impressão massiva de dinheiro. O activo de eleição foi obviamente a dívida soberana, com consequências na taxa de juro implícita: a sua inexorável descida a valores próximos de zero ou mesmo negativos, como aconteceu na Alemanha e outros países do norte da Europa.

Como funciona este mecanismo? Os bancos comerciais que participam nos leilões de dívida pública estão plenamente seguros dos seus investimentos, dado que passou a existir um comprador com bolsos infinitos e dinheiro de monopólio: o banco central.

Para explicarmos este mecanismo, importa, em primeiro lugar, explicar a relação entre a taxa de juro implícita e o preço de uma obrigação. A correlação entre a rentabilidade das obrigações (a chamada Yield To Maturity (YTM)) e o preço das mesmas, é uma correlação negativa. Ou seja, quanto mais baixo for o preço da obrigação, maior será a YTM, e vice- -versa. Para simplificarmos a nossa explicação, vamos supor[1]tá-la num exemplo:

¦ (i) os bancos comerciais participam num leilão de dívida pública, em que um dado Estado deseja colocar 1000 milhões de euros no mercado primário;

¦ (ii) a obrigação emitida pelo estado proporciona um cupão anual de 10 euros;

¦ (iii) o leilão determina que o preço da obrigação é 100 euros, ou seja, uma rendibilidade implícita de 10%;

¦ (iv) seguidamente, os bancos comerciais tentam vender a obrigação no mercado secundário;

¦ (v) dada a enorme procura do banco central por estas obrigações, o preço das mesmas sobe, estabelecendo-se um novo preço de 200 euros por obrigação;

¦ (vi) a nova taxa de juro implícita é 5%, em lugar de 10%, uma descida de 5 pontos percentuais. Isto foi precisamente o que aconteceu nos últimos 13 anos.

Os Estados e os bancos comerciais passaram a estar seguros de que as suas obrigações eram sempre vendidas ao banco central; por essa razão, ocorreu a inexorável descida das taxas de juro implícitas nos últimos anos, em particular em 2020, ano em que ocorreu uma massiva impressão de dinheiro para responder à crise Covid-19.

E qual o impacto desta política no mercado de acções?

Vamos agora imaginar que um investidor tem as seguintes expectativas para a empresa ABC: hoje, perde muito dinheiro, mas, num futuro longínquo, supõe-se que irá ganhar imenso dinheiro. Isto é o que acontece, regra geral, com as empresas tecnológicas. No arranque perdem imenso dinheiro - Amazon, Tesla, Netflix e Uber -, com o propósito de ganhar uma enorme quota de mercado, e depois consolidam a sua posição, podendo vender a preços mais elevados e gerar enormes lucros.

Qual o valor actual dos resulta[1]dos futuros, caso sejam descontados com diferentes taxas de juro?

Se descontarmos a 10%, 5% e 4%, trata-se de um investimen[1]to não interessante. No entanto, para valores inferiores a 4%, o valor actual passa a ser positivo. Quando se aproxima dos 0%, o valor actual começa a subir de forma exponencial. Trata-se precisamente do fenómeno que acontece com os mercados financeiros da actualidade. Esta a explicação para as valorizações estratosféricas a que assistimos recentemente!

(Leia o artigo integral na edição 677 do Expansão, de sexta-feira, dia 03 de Junho de 2022, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)