No actual contexto, a liberdade económica é politicamente inevitável
Claramente que a liberdade económica ainda é uma miragem, i.e., os angolanos que desejam empreender, em quase todos os sectores, enfrentam sérias dificuldades para materializarem os seus sonhos. As dificuldades vão desde a impossibilidade de conseguirem financiamento, por falta de garantias reais, a dificuldades no acesso a utilidades, como água e energia eléctrica.
Na semana passada foi destaque o comunicado do FMI feito em sequência da visita de "avaliação pós-financiamento de Angola". Apesar do acordo de financiamento ampliado ter terminado em 2021, o FMI continua a fazer visitas regulares de avaliação, assegurando-se que Angola esteja em condições de ressarcir o financiamento. Após leitura do documento, decidimos utilizar mais uma vez o TagCrowd para analisar as palavras que o FMI usou para comunicar a sua mensagem. O resultado foi bastante interessante e passamos a apresentar.
A palavra mais usada no comunicado foi "orçamental" utilizada 9 vezes para explicar, dentre outros aspectos, que o Executivo precisa de fazer uma "consolidação orçamental". Ora bem, o que levou o Executivo a solicitar o acordo de financiamento ampliado ao FMI foi o facto de o Programa de Estabilidade Macroeconómica, desenhado em 2017 visar, dentre outros aspectos, reduzir as vulnerabilidades fiscais, reforçar a sustentabilidade da dívida e reduzir a inflação.
Então, como é que se explica que, passado este tempo, o FMI ainda precisa de alertar o Executivo da necessidade de "consolidação orçamental sustentada para mitigar os riscos"? Lembramos aqui que numa recente entrevista a um jornal público, o ministro de Estado para a Coordenação Económica realçou que as reformas económicas estariam a "construir a base para um desempenho mais robusto e sustentável da nossa economia". Acreditamos ser válido perguntar se é possível "um desempenho mais robusto e sustentável" sem consolidação orçamental?
Outras palavras frequentes no comunicado foram "petróleo" (7 vezes) e "petrolífero" (5 vezes), algo que não deixa de ser interessante já que as reformas estruturais implementadas visavam reduzir a petro-dependência, a pobreza e melhorar as condições de vida da população. Hoje sabemos que a condição de vida dos angolanos se deteriorou significativamente no último ano devido à alta inflação e consequente redução do poder de compra da população, bem como o aumento do desemprego, especialmente entre a população mais jovens. Se tivermos em conta que a diversificação económica tem sido a bandeira da actual administração, este recado do FMI vem, mais uma vez, mostrar que muito pouco progresso foi feito nesta direcção.
O FMI aconselha mais uma vez o Executivo a "mobilizar receitas internas não petrolíferas", devendo para o efeito adoptar "medidas de política fiscal". Ora bem, aqui abre-se um outro problema, explicamos num outro texto que a actividade económica em Angola no período pós pandemia da Covid-19 diminuiu consideravelmente. O número de empresas encerradas aumentou 6 (seis) vezes saindo de 559 em 2019 para 3 449 em 2020-21, quando o INE fez o Recenseamento de Empresas e Estabelecimentos. O número de empresas com actividade suspensa aumentou em 75%, saindo de 1 770 empresas em 2019 para 3 097. Neste contexto, como aumentar as receitas não petrolíferas?
Na ânsia de aumentar as receitas não petrolíferas, mostrando-se politicamente indesejável a redução da despesa, quem sofre são os empresários. Não é por acaso que recentemente ouvimos que empresários nacionais estariam a deslocar as suas operações para a Namíbia para depois exportarem para Angola. Claramente que a liberdade económica ainda é uma miragem, i.e., os angolanos que desejam empreender, em quase todos os sectores, enfrentam sérias dificuldades de conseguirem financiamento, por falta de garantias reais, a dificuldades no acesso a utilidades, como água e energia eléctrica. No Polo Industrial de Viana, muitas vezes, o empreendedor é obrigado a montar um posto de transformação, para ter acesso a energia, e ainda assim ser forçado a empatar capital na compra de um gerador devido a falta de confiabilidade, o que torna o seu bem ou serviço menos competitivo.
Leia o artigo integral na edição 784 do Expansão, de sexta-feira, dia 12 de Julho de 2024, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)