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BEPS - desafios para o regime fiscal aplicável ao sector segurador

EM ANÁLISE

Do lado das companhias de seguros, e ainda que não seja espectável que, numa primeira fase, as GloBE rules se apliquem à generalidade dos agentes presentes no mercado segurador angolano, em função do limite mínimo de receitas consolidadas de 750 milhões de euros, é importante determinar os possíveis impactos que as novas regras poderão traduzir.

A fiscalidade apresenta-se como um factor relevante no processo de influência dos comportamentos das empresas e da sociedade em geral, sendo, muitas vezes, utilizada pelos Estados com tal propósito.

Ao longo dos últimos anos tem-se assistido à introdução a nível mundial de regimes fiscais especiais que visam desonerar, total ou parcialmente, os encargos suportados pelos agentes económicos, fomentando a sua "actuação" sustentável.

Este movimento resulta da crescente preocupação dos governos dos países e da própria sociedade civil na criação de um mundo mais sustentável, capaz de optimizar o consumo de recursos do planeta, de combater a pobreza por via da redistribuição da riqueza e de criar oportunidades para todos, designadamente para as minorias mais carenciadas.

São exemplos destes regimes especiais de atenuação da carga fiscal que têm vindo a ser introduzidos nos últimos anos pelos diversos Estados os aplicáveis a: (i) produção e consumo de recursos renováveis, (ii) financiamento de projectos sustentáveis, (iii) criação e manutenção de postos de trabalho destinados a franjas da população mais carenciadas.

Para além destes movimentos legislativos introduzidos individualmente pelos diversos Estados a nível nacional, assiste-se igualmente a acções que, inspiradas pelos mesmos princípios e objectivos, agregam diversos Estados, como é o exemplo da iniciativa BEPS (Base Erosion Profit Shifting) e em concreto da introdução de um nível de tributação mínima de 15% à escala mundial, designado usualmente como GloBE rules (Global Anti-Base Erosion rules) ou Pilar dois, cuja aplicação inicial se previa inicialmente para o início de 2023, mas que foi entretanto adiada.

Este regime tem por objectivo assegurar um nível mínimo de tributação de 15% das empresas a nível mundial, mediante a criação de um regime fiscal de tributação sobre o rendimento, o qual se irá aplicar a grupos multinacionais cuja receita consolidada exceda 750 milhões de Euros.

Tratando-se de um regime que se aplica após os regimes nacionais de imposto sobre o rendimento das empresas (e tomando em consideração o imposto suportado/reconhecido nas demonstrações financeiras), as GloBE rules vêm estabelecer um conjunto de regras próprias para o apuramento da matéria colectável, em grande medida distintas das previstas a nível nacional.

Como é sabido, Angola aderiu à iniciativa BEPS em 2016, mas o seu contexto actual apresenta ainda alguns desafios com vista à articulação com este novo imposto, alguns dos quais se destacam em seguida.

Em primeiro lugar, o regime fiscal angolano de imposto sobre o rendimento das empresas encontra-se assente numa estrutura cedular, estando repartido por vários impostos: o (principal) Imposto Industrial, o Imposto sobre a Aplicação de Capitais (designado usualmente por IAC) e (parcialmente) o Imposto Predial.

A actividade desenvolvida pelas empresas do sector segurador está, por regra, sujeita à incidência destes três impostos que oneram, quer os lucros obtidos pelas próprias companhias, quer os rendimentos obtidos nos investimentos efectuados nas carteiras alocadas às responsabilidades assumidas junto dos tomadores dos seguros.

Este facto traduz, desde logo, um desafio para estas instituições, tendo em conta as diferentes formas de determinação da matéria colectável e as diferentes taxas aplicáveis.

Por outro lado, uma vez que as GloBE rules assentam o seu apuramento no resultado e balanço apurados nas demonstrações financeiras individuais, ajustadas de acordo com as normas contabilísticas aplicáveis no país da sociedade "mãe", o regime contabilístico nacional em vigor actualmente para o sector segurador parece ainda necessitar de alguns ajustamentos/actualizações, como é exemplo o reconhecimento dos impostos sobre o rendimento, designadamente dos activos e passivos (e respectivos rendimentos e gastos) por impostos diferidos.

Este aspecto revela-se de extrema importância, uma vez que, conjugado com o facto de os rendimentos apurados pelas companhias de seguro se encontrarem sujeitos a três impostos diferentes, conforme referido anteriormente, dificulta a tarefa de quantificação de uma estimativa de impactos da entrada em vigor das GloBE rules no médio prazo.

Importa, por último, referir que se tem assistido a um incremento da carga fiscal inicialmente apurada pelas companhias de seguros em resultado de divergências verificadas com as posições assumidas pela AGT no decurso das acções de inspecção desenvolvidas aos anos transactos.

De facto, as divergências verificadas e que se venham a verificar no futuro entre as posições/interpretações da Lei seguidas pelas companhias de seguros e as sustentadas posteriormente pelas equipas de inspecção da AGT não permitem atenuar as dificuldades de quantificação dos impactos da entrada em vigor das novas regras.

Angola tem vindo a desenvolver várias iniciativas que irão debelar alguns dos desafios acima elencados, designadamente no que se refere à anunciada criação de um imposto único sobre o rendimento das empresas e à alteração/modificação do regime contabilístico em vigor para o sector segurador.

Do lado das companhias de seguros, e ainda que não seja espectável que, numa primeira fase, as GloBE rules se apliquem à generalidade dos agentes presentes no mercado segurador angolano, em função do limite mínimo de receitas consolidadas de 750 milhões de Euros, é importante determinar os possíveis impactos que as novas regras poderão traduzir.