Saltar para conteúdo da página

Logo Jornal EXPANSÃO

EXPANSÃO - Página Inicial

Gestão

Ouve: eras bom até te terem dado poder!

EM ANÁLISE

Será verdade? Será que todas as pessoas boas se transformam em pessoas más, quando têm poder? Conhecemos pessoas que estão no poder, que estão à frente de grandes e poderosas instituições, e que são, nitidamente, inequivocamente, inquestionavelmente boas pessoas. Será que estamos enganados em relação a elas?

O Alfredo sempre foi muito sério e focado. Estudava enquanto os outros se divertiam, fechava-se no quarto a ler e a fazer as tarefas enquanto os familiares riam e dançavam, no quintal. Estava determinado a tirar boas notas e a manter a bolsa de estudo, o que conseguiu. Após a universidade, começou a trabalhar numa grande e bem consolidada empresa de construção. Era sério, pontual, responsável, humilde e cumpridor, e facilmente foi conseguindo cargos de maior responsabilidade, até que, já com quase 40 anos, o dono da empresa, o senhor Manuel da Gama, lhe disse: "És como um filho para mim. Confio em ti. Quero fazer-te sócio desta empresa!". Daí até o Alfredo comprar todas as acções da empresa e expulsar o senhor Manuel da Gama do conselho de administração foi apenas uma questão de tempo. Os antigos colegas não o reconheciam: era autoritário, prepotente, despedira quase metade da empresa, e distribuía punições aleatoriamente. O poder praticamente absoluto que tinha nas mãos dava-lhe imenso prazer. Um dos seus antigos amigos, director da área de Recursos Humanos, quando foi despedido, acusado de estar completamente ultrapassado e obsoleto, e de ser extremamente aborrecido, disse ao Alfredo: "Ouve: eras bom até te terem dado poder!". O Alfredo sorriu: "Não te esqueças de levar essas estúpidas plantas contigo!".

Disse Lord Acton (1834- -1902): "O poder tende a corromper, e o poder absoluto corrompe absolutamente, de modo que os grandes homens são quase sempre homens maus".

Será verdade? Será que todas as pessoas boas se transformam em pessoas más, quando têm poder? Conhecemos pessoas que estão no poder, que estão à frente de grandes e poderosas instituições, e que são, nitidamente, inequivocamente, inquestionavelmente boas pessoas. Será que estamos enganados em relação a elas? Ou será que o poder que têm não é tão absoluto assim e, por isso, não são corrompidos pelo mesmo? Será que os seus princípios são mais fortes e mais importantes que o poder que detêm? Será possível ser bom, mesmo detendo o poder absoluto de ser mau?

Tal como eu ensino aos meus alunos do 1.º ano de Psicologia: há o (muito importante) conhecimento empírico, que obtemos pela observação, pela experiência, até "pelo que se diz", e depois há o conhecimento científico, que pode, através da investigação e da experimentação, comprovar e validar esse conhecimento empírico (ou não).

O que é que a Psicologia nos diz sobre a capacidade de um cargo ou um papel poder corromper uma pessoa, transformando uma pessoa boa numa pessoa perversa? Bem, vamos apresentar o famoso experimento de Philip Zimbardo, professor emérito da Universidade de Stanford, premiado, em 2005, com o Havel Foundation Prize pela sua vida de pesquisa sobre a condição humana. Mas aviso que os resultados são verdadeiramente assustadores.

Philip Zimbardo, em 1971, levou a cabo a experiência da prisão de Stanford, para descobrir como se comportariam as pessoas se lhes fosse dado poder absoluto. Participaram, na experiência, 24 estudantes universitários da classe média, previamente submetidos a uma avaliação que confirmou a sua saúde mental. Com uma moeda, decidiu-se, pelo método "cara ou coroa", quem seria guarda e quem seria prisioneiro. Num domingo de manhã, os estudantes a quem calhou o papel de prisioneiros foram detidos nas suas casas por verdadeiros polícias (que aceitaram participar na experiência), acusados de roubo, e conduzidos para a cave do Departamento de Psicologia da Universidade de Stanford, transformada em prisão, para os propósitos do experimento.

À chegada, os prisioneiros foram despidos, registados, inspeccionados e desparasitados, e receberam uniformes, lençóis, e números, em vez de nomes, assim como uma grilheta no tornozelo, para nunca esquecerem o seu papel de presos. Por sua vez, os guardas vestiam uniformes de estilo militar, usavam óculos de sol (para impedir o contacto visual), tinham as chaves das celas, apitos, algemas e cassetetes, e vigiavam 24 horas por dia. Os guardas tinham controlo absoluto sobre os prisioneiros e autorização para aplicarem as medidas que considerassem necessárias, para manter a ordem. O experimento saiu rapidamente do controlo. Os guardas começaram a abusar da autoridade, negando comida a alguns prisioneiros, retirando os colchões a outros e obrigando-os a dormir sem roupa no piso de cimento, interrompendo o sono, negando o direito a utilizar a casa de banho, encapuzando alguns prisioneiros, obrigando-os a limpar as sanitas com as mãos e a participar em jogos degradantes, obrigando alguns prisioneiros a despir-se diante de todos, obrigando-os a fazer exercícios físicos e humilhando-os.

O próprio pesquisador, Zimbardo, relatou que se sentiu envolvido na experiência, a tal ponto que, no quarto dia, ele e os guardas, ao ouvirem rumores sobre um plano de fuga, tentaram transferir a experiência para um departamento de polícia local, em desuso. A polícia não permitiu, e Zimbardo sentiu-se irritado. Entretanto, os guardas iam ficando cada vez mais sádicos, principalmente à noite, quando acreditavam que as câmaras estavam desligadas. A experiência, que havia sido desenhada para durar duas semanas, durou apenas seis dias, por Zimbardo ter percebido que a situação se tornara perigosa.

Leia o artigo integral na edição 748 do Expansão, de sexta-feira, dia 27 de Outubro de 2023, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)

Logo Jornal EXPANSÃO Newsletter gratuita
Edição da Semana

Receba diariamente por email as principais notícias de Angola e do Mundo