"Os accionistas já investiram mais de 500 milhões USD no Lobito"
O novo gestor da entidade privada criada para gerir o transporte de carga no Caminho-de-Ferro de Benguela (CFB) chegou ao País para reforçar a estratégia comercial da empresa e aliviar a carga política que envolve o Corredor do Lobito.
Nos últimos dias tem estado a apresentar-se publicamente, depois de concretizadas algumas mudanças no conselho de administração da LAR. Como encontrou a empresa e o que espera alcançar em Angola?
Cheguei no dia 1 de Maio, depois de um longo período de transição liderado pelo meu antecessor, Francisco Franca, que me impressionou muito pelo trabalho que fez aqui na implementação das bases deste projecto. Foi ele que assumiu a gestão desde o início e liderou esta operação impressionante no Porto do Lobito, sobretudo no terminal mineiro, que não estava a ser usado quando ele chegou e agora está operacional. Tive a oportunidade de fazer a viagem completa de comboio entre Kolwezi (RDC) e Lobito e constatei todo o trabalho que foi feito na ferrovia, nas estações, nos carris, com a substituição de muitas partes danificadas, enquanto montávamos uma equipa de trabalho, que também é algo muito importante, obviamente.
Quantas pessoas trabalham actualmente na LAR?
Quando o projecto começou, contratámos muitos funcionários do CFB e também do Porto do Lobito. Isso foi há cerca de um ano, com 420 pessoas, e agora já somos 945 elementos a trabalhar realmente como uma equipa. Ficámos muito impressionados com o número de funcionários que foram contratados, formados e que estão a ter um desempenho extremamente bom. 98% dos nossos trabalhadores são angolanos, estamos realmente a contribuir para o desenvolvimento das pessoas do Lobito, mas também de todas as cidades e aldeias por onde o comboio transita. É um projecto enorme, como podem imaginar, que inclui um terminal portuário e caminhos-de-ferro que percorrem 1.289 quilómetros, em Angola, e mais 450 quilómetros na RDC.
Um dos principais riscos para a vossa operação no Lobito é a necessidade de articular diariamente com diversas entidades públicas e privadas. Como tem decorrido o relacionamento entre a LAR e o CFB, que é uma empresa pública, e que mantém a gestão do transporte de passageiros, um serviço fundamental para a região?
O nosso projecto é principalmente para transportar carga, mas trabalhamos em conjunto com o CFB. Fazemos o planeamento das viagens e também a coordenação com os comboios de passageiros. O nosso acordo indica que os comboios de passageiros têm sempre prioridade. Trabalhamos em equipa e temos uma excelente relação também com o Porto do Lobito. O governo e o Ministério dos Transportes estão realmente a trabalhar connosco para que isto seja um sucesso. Outra coisa que me tem impressionado é a responsabilidade, envolvimento e empenho dos meus accionistas.
Tenho três accionistas (com dois accionistas principais), que são empresas altamente conceituadas em todo o mundo, mas também em Angola, como a Trafigura. Os dois principais accionistas têm estado realmente empenhados e já investiram aqui mais de 500 milhões USD.
É o valor investido até ao momento?
Isso mesmo, 500 milhões USD, que foram aplicados na formação e contratação de pessoal, mas também na recuperação do terminal mineiro, na reparação da ferrovia, estações e do material circulante. Investimos ainda na compra de novos activos, como é o caso dos 1.500 vagões adquiridos na China. Tenho a certeza que vai ser um sucesso. Os nossos accionistas e restantes partes interessadas também acreditam na nossa estratégia. Estamos realmente empenhados neste projecto em Angola.
Também referiu que foi necessário adquirir novos equipamentos. Quantos vagões já receberam da China e da África do Sul?
Queremos sempre aumentar o número de comboios que operamos. Também não podíamos recorrer apenas a um único fabricante, porque não teria capacidade para satisfazer as nossas necessidades. No início, herdamos muitos vagões do CFB. Entretanto comprámos vagões novos na África do Sul e China. Do lado angolano, temos 30 locomotivas, mas apenas 20 estão em condições de funcionamento. As restantes estão a ser renovadas. Em termos de vagões, temos 400. Com as aquisições que fizemos, estamos a receber seis vagões por mês da África do Sul. Quanto aos vagões chineses, em Julho recebemos 100 de uma só vez, porque vêm de barco. E vamos receber mais 170 no próximo ano.
A rapidez é um elemento fundamental para o sector dos transportes. Que velocidade média estão os comboios a atingir neste momento?
Limitamos a velocidade do comboio de passageiros a um máximo de 50 km/hora. Para a carga, o limite máximo é 45 km/hora. Em algumas zonas podemos limitar para 30 km/hora por questões de segurança. Ainda temos alguns pontos com restrições de velocidade. Há um ano, tínhamos 250 pontos deste género e agora estamos abaixo de 100. Até ao final de 2025 queremos chegar a menos de 50. O nosso objectivo é chegar a Março de 2026 sem quaisquer restrições de velocidade em toda a extensão da linha.
O ciclo de carga Lobito-Luau-Lobito chegou a demorar mais de 5 dias de viagem.
Neste momento, fazemos menos de 48 horas de viagem entre Lobito e Luau. O ciclo completo [Lobito-Luau-Lobito] está a ser feito em menos de 100 horas. Temos um histórico muito bom em termos de segurança e contamos com duas ou três grandes equipas de segurança e manutenção, que podem actuar ao longo de toda a linha. Também temos, como podem imaginar, a assistência da Polícia e das forças armadas. Não queremos viver episódios de sabotagem ou mesmo de pessoas a atirar pedras contra os comboios. Por alguma razão, as crianças gostam de atirar pedras. Em termos de segurança contamos com cerca de 500 colaboradores. A segurança é a nossa primeira prioridade. É por isso que é tão importante reparar e manter a ferrovia.
Algumas informações indicavam que os vários acidentes que aconteceram nos últimos anos também estavam relacionados com a ausência de sistemas de comunicação adequados.
Sim, em termos de comunicação agora temos maior redundância, reforçada com a utilização de telemóveis, naturalmente, telefone por satélite e comunicações via rádio. Temos uma tripla redundância e o telefone por satélite está sempre disponível. Os comboios também estão instalados com GPS e são monitorizados através da sala de controlo, onde é possível ver exactamente a sua localização. Assim não teremos colisões.
Diversos especialistas alertaram para a necessidade de fazer correcções técnicas na linha do CFB e remodelar troços inteiros. Essa informação está correcta?
Já fizemos isso, grande parte da ferrovia tem os carris reparados. Antes eram todos de madeira e nós substituímo-los por metal ou betão. Ainda colocámos vários balastros para garantir que a aplicação foi efectuada de forma correcta. Isso já foi feito, mas obviamente é algo que não pára. Durante os 28 anos restantes da concessão, vamos continuar a monitorar os carris e a colocar novos balastros, porque vão se danificando com o tempo. É por isso que temos um contrato de manutenção - para garantir que podemos trocar as secções danificadas sempre que for necessário. Será uma luta constante durante os próximos 30 anos.
Leia o artigo integral na edição 841 do Expansão, de sexta-feira, dia 29 de Agosto de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)