Bancos na África Subsariana viram-se cada vez mais para dívida pública e prejudicam PMEs
Participações dos bancos africanos em dívida soberana cresceram 69,9%, passando de 10,3% das suas carteiras em 2010 para 17,5% em 2023. Relatório do BEI levanta preocupações sobre riscos crescentes para sistema bancário.
Pressionados para atender as necessidades de financiamento dos governos africanos, os bancos de África Subsariana viram-se cada vez mais para o negócio da dívida pública, descurando as necessidades de financiamento do sector privado, revela o relatório "Finanças em África", do Banco Europeu de Investimento (BEI), que abrange inquéritos a 51 bancos na região.
Esta tendência, conhecida como "efeito crowding-out", levanta preocupações sobre os riscos crescentes para o sistema bancário africano, porque aumenta a exposição dos bancos aos riscos da dívida governamental, e limita os fundos disponíveis para empréstimos ao sector privado, alertam os autores do relatório, que mostra que as participações dos bancos africanos em dívida soberana doméstica cresceram 69,9%, passando de 10,3% das suas carteiras em 2010 para 17,5% em 2023.
Como efeito, o crédito ao sector privado na África Subsaariana caiu 35,7%, passando de 56% do produto interno bruto (PIB) em 2007 para 36% do PIB em 2022 (ver gráfico). "Isso foi associado ao crescimento relativamente fraco do stock de capital privado, que está num nível mais baixo em África do que noutras regiões", o que pode "ter contribuído para um desenvolvimento mais fraco do sector privado e menos industrialização", referem os autores do relatório, notando que "a falta de acesso ao financiamento é uma restrição estrutural fundamental ao desenvolvimento".
Esse efeito de "crowding out" - em que os bancos favorecem a dívida governamental em vez de empréstimos ao sector privado - atingiu níveis recordes em 2023, especialmente na África Oriental, Austral e Ocidental, prejudicando "o potencial de crescimento económico e inovação".
Na África Central, as participações na dívida governamental aumentaram de 2,6% dos activos bancários em 2010 para 24%. A África Ocidental e Austral viu aumentos semelhantes de 7% a 9%. Já o crédito aos privados diminuiu mais acentuadamente na África Austral, onde caiu 12,1% dos activos, enquanto a África Central, Ocidental e do Norte registaram declínios de 2% a 3%.
Alto retorno
O "apetite" dos bancos por activos governamentais decorre de realidades financeiras. "Os títulos do governo, embora de baixo risco, oferecem altos retornos que atendem às metas de lucro dos bancos", evidencia o relatório, que aponta exemplos. O Gana levantou fundos com títulos a render 19%, enquanto o Quénia ofereceu mais de 12% - em comparação com os 5% a 8% que os bancos ganham em empréstimos para pequenas e médias empresas (PMEs).
"Esse alto retorno sobre a dívida pública torna-a atraente para os bancos, desviando o seu foco do sector privado", resume o relatório, que estima a lacuna de financiamento anual para as PMEs na região subsariana em 194 mil milhões USD.
As PMEs, que representam 80% dos negócios e fornecem 60% dos empregos, estão entre as mais afectadas pelo acesso reduzido ao crédito. De acordo com o relatório do BEI, 57% das PMEs citam o financiamento limitado como o seu principal obstáculo ao crescimento, enquanto 45% lutam para ter acesso a empréstimos de tesouraria.
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