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África

Eleição de Lula reaproxima Brasil ao continente africano

RELAÇÕES COMERCIAIS COM ÁFRICA CAÍRAM PARA NÍVEIS ANTERIORES A 2010

No dia em que o vice-presidente eleito do Brasil, Geraldo Alckmin, iniciou contactos com o vice-presidente Hamilton Mourão para a transição governamental, Lula da Silva confirmou a presença na COP27, em Sharm el-Sheikh, Egipto, a primeira em solo africano, e iniciou o processo de reaproximação a África.

A eleição de Lula da Silva, nas presidenciais de 30 de Outubro, representa o fim do isolamento do Brasil e o reatar da relação com África, impulsionada nos dois mandatos do presidente reeleito, num eixo Sul-Sul, que teve como parceiros privilegiados os países de língua portuguesa, no quadro da CPLP, e a África do Sul, o único africano no bloco de países emergentes BRICS, acrónimo de Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.

No seu discurso de vitória, o candidato do Partido dos Trabalhadores (PT), que encabeçou uma "frente ampla" para impedir a reeleição de Jair Bolsonaro (o único Presidente brasileiro que só cumpre um mandato), sinalizou o fim do tempo em que o Brasil assumiu o "triste papel de pária do mundo" e anunciou o regresso do Brasil que falava de "igual para igual com os países mais ricos e poderosos" e que "contribuía para o desenvolvimento dos países mais pobres".

Lula prometeu restaurar o apoio ao "desenvolvimento dos países africanos, por meio da cooperação, investimento e transferência de tecnologia", invertendo a queda nas relações comerciais com África. "Não é segredo que as relações afro-brasileiras sofreram uma queda drástica durante o governo do presidente Jair Bolsonaro. Que o diga o economista guineense Carlos Lopes, que traçou um quadro frustrante das relações entre Brasil e África", escreveram, há um ano, Mohammed Nadir, Magaly Morais, Enrique Lima, Pedro Lagosta e Flávio Thales.

Ponte entre tecido económico do Brasil e África

Longe ia o tempo em que "grandes empresas brasileiras faziam a ponte entre o tecido económico brasileiro e África", como a Odebrecht (a mais atingida pelo escândalo da Lava Jato), Camargo Corrêa, Vale e a Petrobras, como recordam os cinco investigadores, no artigo publicado no Observatório de Política Externa e da Inserção Internacional do Brasil (OPEB).

Os dados da Secretaria de Comércio Exterior do Brasil ilustram o esvaziamento das relações comerciais com África durante o mandato de Bolsonaro. As vendas de produtos brasileiros a países africanos recuaram 7% em 2019, face a 2018, para 7,5 mil milhões USD. Só de Janeiro a Maio, as exportações brasileiras para países africanos recuaram 39% para 2,8 mil milhões USD, portanto ainda não reflectiam o impacto da pandemia da Covid- -19, sinalizando uma tendência descrescente nas relações comerciais Brasil-África, ao contrário do que se verificou nos dois mandatos de Lula da Silva.

Nos dois governos de Lula, as trocas comerciais com África mais do que triplicaram, passando de 2,4 mil milhões USD em 2003 para quase 8 mil milhões USD em 2010, referem os professores de Relações Internacionais Paulo Fagundes Visentini e Analúcia Danilevicz Pereira.

Mais acordos, mais países e áreas de cooperação

"Os acordos realizados entre 2003 e 2010 não só cresceram em número e na diversidade dos países com que foram fechados, como também representaram a diversificação das áreas abrangidas, com destaque à Saúde, Agricultura e Educação", afirmam Flávio Thales Ribeiro Francisco, Giovanna Bonato Matrone, Isabela Costa Campos e Vitor Hugo dos Santos, numa intervenção após os primeiros sete meses da presidência Bolsonaro, com o título "O realinhamento brasileiro e o fim da África estratégica".

O texto revela a "apreensão" à tendência de "refluxo nas relações entre brasileiros e africanos", em contramão com "a influência africana" no Brasil, país com África no seu ADN cultural e biológico, muitas vezes renegado pelas elites políticas e económicas. No artigo, os quatro académicos fazem referência a um encontro do ex-ministro das Relações Exteriores angolano, com o seu homólogo brasileiro, Ernesto Araújo, na manhã de 2 de Janeiro de 2019, onde Manuel Domingos Augusto tenta perceber se os "comentários racistas" de Bolsonaro durante a campanha eleitoral se iriam traduzir no arrefecimento das relações com África. Receio que se veio a verificar ser fundamentado.

Antes mesmo de tomar posse, prevista para 1 de Janeiro de 2023, Lula da Silva inicia o movimento contrário, confirmando a sua presença, em Sharm el-Sheikh, Egipto, entre 7 e 18 de Novembro, para participar na COP27, Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, que pela primeira vez se realiza num país africano. O sim ao convite, dirigido pelo próprio Presidente egípcio, Abdel Fattah al-Sisi, segundo o seu porta-voz, Bassam Rady, representa também o regresso do Brasil aos esforços contra a crise climática e a desflorestação da Amazónia, um dos pulmões do planeta. O presidente do Egipto alimentou esperanças sobre o "papel positivo e construtivo" que o Brasil irá desempenhar, acrescentou Rady, citado pela AFP.