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Opinião

Angola precisa de um "choque de exportação"

MILAGRE OU MIRAGEM?

Infelizmente, Angola continua incapaz de produzir localmente grande parte dos bens e serviços de que necessita, o que torna o País muito dependente do exterior. Neste contexto, o combate à inflação fica muito dependente da política cambial, fazendo com que a demanda por divisas seja uma constante. No entanto, o principal produto de exportação, o petróleo, regista um declínio da produção, dificultando ainda mais o fomento da produção nacional.

Os dados sobre a inflação em Luanda publicados recentemente pelo INE (ref. Junho) indicam uma ligeira desaceleração mensal (2,96% em Maio vs 2,58% em Junho 2024) porém, a variação homóloga (Junho 2023 vs Junho 2024) registou um aumento de 31,46 pontos percentuais (p.p.), estando agora nos 42,82%. Examinando a contribuição por classes de despesas, os dados do INE mostram que a classe de bens alimentares e bebidas não alcoólicas é a que mais contribuiu para o aumento registado com 1,75 p.p., seguindo-se outras classes como a de "Bens e Serviços diversos" e "Vestuário e calçados".

Infelizmente, Angola continua incapaz de produzir localmente grande parte dos bens e serviços de que necessita, o que torna o País muito dependente do exterior. Neste contexto, o combate à inflação fica muito dependente da política cambial, fazendo com que a demanda por divisas seja uma constante. No entanto, o principal produto de exportação, o petróleo, regista um declínio da produção, dificultando ainda mais o fomento da produção nacional. Hoje é inegável que já existe alguma produção incipiente, muito dependente da importação de produtos intermédios para além de bens de capital. Nota de realce é o facto do discurso político dar ênfase ao fomento de uma produção virada para a substituição das importações, quando a evidência empírica mostra que os países que rapidamente conseguiram transformar as suas economias, falamos por ex., da China, Coreia do Sul, foram aqueles que conseguiram combinar essa substituição das importações com a conquista de novos mercados via exportações.

No caso de Angola acreditamos que poderia servir de inspiração para o Executivo de João Lourenço, o posicionamento adoptado por Otto von Bismarck (1815-1898), nas vestes de Chanceler alemão, quando defendeu que a Alemanha deveria "Exportar ou morrer!". Essa ideia foi seguida com algum sucesso em 2001 por Fernando Henrique Cardoso, então Presidente do Brasil, quando sugeriu que o Brasil precisava de um "choque de exportação". Temos defendido que o Executivo precisa fomentar a exportação daqueles produtos onde já existe capacidade produtiva instalada, mas nesta altura subaproveitada, como o cimento, as bebidas, podemos incluir o aço nesta lista, desde que estes produtos sejam produzidos de forma competitiva. Abrimos aqui um parêntesis para explicar que tal não acontece pelo livre arbítrio do mercado, é preciso uma intervenção do Estado, por ex., melhorando o acesso dessas unidades produtivas a utilidades como água e luz, e criando novos incentivos.

Como parte do "choque de exportação" o Executivo precisa de assegurar, por exemplo, que as rochas ornamentais (falamos do mármore e granito da Huíla e Namibe) sejam exportadas depois de processadas localmente. O Executivo necessita de normalizar a produção artesanal de diamantes (e outros metais preciosos), para depois formalizar o processo de exportação, fazendo o que o Presidente João Lourenço defendeu no seu discurso sobre o Estado da Nação de 2019, i.e., "reorganização e legalização das cooperativas de diamantes, visando a sua transformação em empresas de exploração semi-industriais". Abrimos aqui um outro parêntesis para dizer que o Executivo precisa implementar o que diz o artigo 173.º que, no seu ponto 2 do Código Mineiro, i.e., que "As áreas consideradas adequadas para a mineração artesanal são apenas aquelas cujas características geológicas não permitam a realização da actividade mineira em escala industrial." Daí a necessidade de se promover, de forma natural e contínua, a concessão desses espaços, reduzindo o caracter informal que a produção artesanal de diamantes hoje apresenta.

No sector de serviços, Angola pode exportar serviços ligados ao sector da construção e telecomunicações desde que sejam criados incentivos. Por ex., o crescimento verificado no sector da construção no período pós-guerra fez com que Angola tivesse hoje empresas capazes de executar projectos a nível do continente, onde poderiam inserir igualmente materiais de construção feitos em Angola, desde que tais empresas fossem capazes de oferecer preços competitivos, e a internacionalização das suas operações estivesse enquadrada numa política de Estado. O Executivo poderia condicionar os apoios externos que dá a alguns países a internacionalização das empresas angolanas. Notem que foi através deste tipo de iniciativa que a China conseguiu conquistar novos mercados, incluindo em África.

Enfim, apesar de Angola viver um período bastante difícil, caracterizado pela alta inflação, fraca actividade económica empresarial, alto desemprego, acreditamos que existem alternativas para se diversificar as exportações e com isso aumentar-se o fluxo de divisas para a economia. Por via de políticas assertivas estes recursos poderiam estar ao serviço da produção nacional, dinamizando os sectores primários e secundários da economia, aumentando a oferta de bens e serviços com inputs de produção local.

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