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Opinião

O sonho angolano dos voos Luanda-Estados Unidos

CONVIDADO

Nunca se devem confundir os desejos comerciais, políticos e diplomáticos dos governantes e a rentabilidade financeira necessária para justificar ligações aéreas directas. O que conta mesmo são os números. Ter um novo aeroporto não muda esta situação e ter mercado também não é suficiente.

A existência de voos diretos entre Angola e Estados Unidos permanece como um sonho inalcançado para muitos políticos angolanos que vêem na inauguração de um tal voo um ato de reconhecimento e de prestígio. Essa aspiração tem enfrentado uma série de obstáculos, desde questões de segurança, direitos de tráfego, transferência de dinheiro e até considerações práticas relacionadas com a infraestrutura aeroportuária. E, sobretudo, falta de tráfego que pague o preço de um voo direto, porque com voos grátis esta ligação não sobreviverá.

A World Airways operou voos sem escala para Angola, principalmente durante os anos 1990 e 2000, sendo a rota mais comum aquela que ligava Luanda a Houston, no Texas, com um avião do tipo MD-11. Esses voos geralmente transportavam funcionários de empresas petrolíferas americanas que trabalhavam em Angola. A World Airways era uma das principais transportadoras que atendia essa procura específica de transporte de funcionários e estes voos não estavam abertos à venda para o grande público.

As empresas só recorrem a esse tipo de serviços especiais quando não têm outra alternativa e quando nenhuma companhia aérea comercial se predispõe a voar essa rota. As empresas petrolíferas teriam preferido simplesmente comprar os bilhetes aéreos em vez alugar um avião inteiro. Esse desejo chegou a ser quase concretizado com o anúncio realizado pela Delta Airlines no final de 2010. Após um processo de aprovação governamental que demorou dois anos, a Delta anunciou a abertura de uma nova rota Atlanta-Dakar-Luanda integrada numa expansão africana alargada da companhia. Esta rota, que teve data de lançamento prevista para janeiro de 2011 com três voos por semana, acabou por nunca se concretizar. Na altura, as razões apontadas estavam sobretudo ligadas à viabilidade económica e à inexistência de clientes com volume significativo.

Outros fatores poderão ter contribuído para a decisão de não avançar com a rota: uma rota muito longa é mais sensível às flutuações do preço do petróleo; existem também as questões de infraestrutura e as regulamentações específicas do país, os recursos humanos e as dúvidas sobre a capacidade operacional e conformidade do país com os padrões da companhia, seja em termos logísticos, jurídicos, comerciais, de manutenção ou da simples estadia para as tripulações. Nalguns países a flutuação cambial e a dificuldade de repatriar o valor das vendas é igualmente um grave problema. Em última análise, a Delta Airlines terá pesado todos esses fatores e os riscos e fez marcha atrás.

Nunca se devem confundir os desejos comerciais, políticos e diplomáticos dos governantes e a rentabilidade financeira necessária para justificar ligações aéreas diretas. O que conta mesmo são os números. Ter um novo aeroporto não muda esta situação e ter mercado também não é suficiente. A Nigéria é um dos países com mais tráfego para os Estados Unidos, mas é tão difícil retirar de lá o dinheiro que, em termos de voos, a Nigéria acaba por ter tantos como o seu vizinho minúsculo, o Togo. De um modo geral, existem poucas ligações aéreas diretas entre os Estados Unidos e África. "Existem alguns desafios operacionais relativamente a alguns países africanos, mas o factor concorrência das múltiplas companhias e ligações diárias de vários aeroportos americanos via Europa, Médio Oriente e via alguns aeroportos- -chave de África é determinante.

De acordo com os dados recolhidos através da OAG, dos 4,5 milhões de passageiros que viajaram entre os Estados Unidos e África em 2023, 80% fizeram-no via um "hub" pelas mais diversas razões: preço, horários, programa de milhas e... inexistência de voos diretos na rota desejada. Para o pico do Verão de 2024, os dados recolhidos pela SkyExpert junto da Cirium Diio, revelam que existirão 25 rotas e 129 voos semanais diretos operados por 8 companhias aéreas diferentes entre 7 aeroportos dos EUA e África. Na prática, existirão 18 voos diários entre EUA e África.

Apenas a título comparativo: o número de voos diários entre Londres Heathrow e o aeroporto JFK de Nova Iorque é de 28 voos por dia. A Ethiopian Airlines é a companhia que terá mais frequências semanais (30), seguida da Delta Airlines (27), da Royal Air Maroc (24), United Airlines (19), Egyptair (14), Kenya Airways (4) e Azores Airlines (4); em último lugar surge a Air Senegal com duas frequências por semana. Algumas destas rotas exigem uma escala intermédia, mantendo os passageiros a bordo.

Leia o artigo integral na edição 768 do Expansão, de sexta-feira, dia 22 de Março de 2024, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)