Angola e a falha na execução: Um problema sistémico
O ambiente organizacional angolano é marcado por uma cultura predominantemente reactiva, onde as empresas costumam agir apenas diante de crises e desafios imediatos. Essa mentalidade de curto prazo não afecta apenas a gestão interna das empresas - ela compromete a economia nacional como um todo.
Em Angola, a distância entre ambição e realidade é medida pelo número de planos estratégicos que nunca saem do papel. O país tem o talento, os recursos e a ambição, mas falha naquilo que realmente importa: transformar estratégia em resultados. O execution gap não é apenas um problema de gestão - é o maior entrave ao crescimento económico de Angola
O ambiente organizacional angolano é marcado por uma cultura predominantemente reactiva, onde as empresas costumam agir apenas diante de crises e desafios imediatos. Essa mentalidade de curto prazo não afecta apenas a gestão interna das empresas - ela compromete a economia nacional como um todo. Como consequência, Angola continua dependente do petróleo, o sector produtivo é frágil e as promessas de transformação económica são repetidas ano após ano, sem mudanças reais.
Muitas organizações em Angola tratam o planeamento estratégico como uma mera formalidade. Os planos são frequentemente elaborados para cumprir exigências regulamentares, impressionar stakeholders ou simplesmente preencher relatórios corporativos. Isso cria um cenário em que a estratégia é vista como um conceito abstracto, e não como uma ferramenta prática.
Muitos planos falham porque são, logo à partida, inadequados na concepção, na construção e na estratégia que perseguem. Os erros mais comuns incluem:
■ Metas genéricas e inalcançáveis: Aspirações grandiosas sem um roteiro detalhado e sem KPIs específicos para medição do progresso;
■ Desconexão com as realidades do mercado e operacional: Falta de alinhamento com os drivers do mercado e com a capacidade real das organizações para executar as acções propostas;
■ Falta de integração com o plano de negócios: O planeamento estratégico deveria servir como base para a operação da empresa, mas, em vez disso, torna-se um documento isolado, com metas financeiras irreais e projectos sem orçamento (STRATEX);
■ Planos rígidos e inflexíveis: Planos concebidos como documentos estáticos, sem mecanismos dinâmicos para ajustes contínuos durante a execução.
No entanto, mesmo quando os planos são bem concebidos, há um segundo obstáculo: a execução. Um estudo da Harvard Business Review revelou que mais de 60% das estratégias empresariais falham não por falta de visão, mas porque não são bem implementadas. Um dos principais factores para o fracasso da execução é a ausência de responsabilização e comprometimento real com os resultados. Em muitas organizações angolanas, tanto no sector privado quanto no público, a prestação de contas é difusa e diluída - ninguém se sente verdadeiramente responsável pelo cumprimento das metas, seja na liderança ou nas operações.
Sem accountability, os erros são normalizados, as falhas são justificadas com desculpas genéricas e as consequências são inexistentes. Sem responsabilização, a execução nunca será uma prioridade. Empresas e governos eficientes têm um sistema de medição rigoroso e, mais importante, cobram o mais alto nível de execução.
A falha na execução de estratégias tem impactos profundos para as organizações, incluindo:
■ Desperdício de recursos: Empresas com baixa eficácia na execução estratégica gastam até 30% a mais em custos operacionais desnecessários;
■ Perda de competitividade: Uma estratégia mal-executada pode reduzir margens de lucro ao gerar custos adicionais ou impedir ganhos esperados.
Se no sector privado o "execution gap" impacta directamente a rentabilidade e o crescimento das empresas, no sector público, compromete o desenvolvimento económico e social do país, como foi possível verificar pela fraca execução de Programas críticos do Governo, como o PND 2018-2022 e o PRODESI - Programa de Diversificação da Economia e Substituição das Importações. O PRODESI previa que, até 2022, o sector não petrolífero gerasse 50% do PIB. Mas, em 2024, o petróleo ainda domina a economia: mais de 70% das receitas fiscais e 90% das exportações.
No final, esses planos viram arquivos esquecidos ou são revisitados apenas quando chega o momento de preparar um novo documento para o próximo ciclo, sem qualquer reflexão sobre os fracassos da implementação anterior.
Leia o artigo integral na edição 816 do Expansão, de sexta-feira, dia 07 de Março de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)
**JOSEMAR AFONSO, Manager da KPMG Angola