O que diz a Constituição da República sobre os direitos económicos e sociais dos cidadãos? 2.ª Parte
Esta é a continuação do artigo publicado no dia 2 do corrente mês sobre o cumprimento de direitos básicos constitucionais de natureza económica e social.
Também por aqui pode passar a possibilidade de se reforçarem alguns dos fundamentos económicos que asseguram um funcionamento mais eficiente do sistema económico nacional e uma incidência social mais alargada dos ganhos de produtividade e de rendimento.
A linha de reflexão para estes dois artigos foi verificar se os preceitos constitucionais tinham reflexo positivo nos índices internacionais relacionados com os nossos direitos fundamentais.
O Título III - Organização Económica, Financeira e Fiscal -, nos seus artigos 89.º - Princípios Fundamentais - e 104.º - Orçamento Geral do Estado -, estabelece como princípios fundamentais, entre outros:
1) "Livre iniciativa económica e empresarial, a exercer nos termos da lei". Esta livre iniciativa pressupõe acesso completo à informação para a tomada de decisão, conhecimento das oportunidades de negócios que a economia cria (incluindo-se o próprio Estado), igual acesso às fontes de financiamento do investimento privado e regulamentação estatal racional (que não induza distorções).
Em Angola, o acesso à informação é assimétrico e o conhecimento das grandes oportunidades de negócio criadas pelo Estado (projectos públicos e fornecimento de bens e serviços) é restrito ao círculo político do partido do Governo. Estas queixas são recorrentes da maior parte dos agentes privados independentes (e provavelmente, os mais capazes).
Em termos gerais, não existe liberdade económica em Angola, nas balizas estabelecidas na Constituição. O Índice de Liberdade Económica1 - que avalia o grau de liberdade económica de 178 economias, segundo quatro grupos de itens, como o Estado de Direito, a dimensão do Governo, a eficiência ao nível da regulação e a criação de novos negócios - coloca Angola na 158.ª posição em 2015, com uma pontuação de 47,9 pontos.
Segundo os níveis de liberdade económica estabelecidos pela 'Economic Freedom of the World', Angola é considerada um país "repressor", ou seja, o direito a fazerem-se negócios de uma forma livre e transparente está fortemente condicionado entre nós.
A liberdade económica também pode ser analisada através do 'Doing Business' do Banco Mundial, publicação sistematicamente alvo de críticas oficiais, quanto à sua credibilidade, mas de utilização crescente no mundo dos negócios2. E a posição do nosso País tem permanente piorado de ano para ano, a despeito de o Banco Mundial, em dois itens, reconhecer algumas melhorias ao longo do tempo. Em 2015, Angola ocupa a 181.ª posição, entre 189 países, o que significa considerá-la como uma economia que não favorece a liberdade de se fazerem negócios.
2) "A execução do Orçamento Geral do Estado obedece aos princípios da transparência e boa governação e é fiscalizada pela Assembleia Nacional e pelo Tribunal de Contas, em condições definidas por lei". Os cidadãos e as empresas são quem paga os impostos ao Estado e, por isso, têm o direito de exigir o que o artigo 104.º estabelece em matéria de transparência, boa governação e fiscalização.
Os impostos equivalem a recursos financeiros que a sociedade subtrai aos seus rendimentos (famílias e empresas) e os entrega ao Estado/Governo na presunção de uma correcta utilização em benefício da sociedade e da economia. Assim sendo, é um direito fundamental os cidadãos exigirem e o Estado/Governo cumprir a boa governação e a transparência. O que se passa então de concreto nestes itens? O 'Índice de Boa Governação em África' - vulgarmente conhecido como 'Índice Mo Ibrahim' - posiciona Angola na 44.ª posição em 2014, entre 52 países africanos e com uma pontuação de tão-somente 40,9 (para um total de 100 pontos).
O significado prático deste indicador é que o dinheiro que os cidadãos entregam ao Estado a título de impostos e outros tributos não é bem governado, perdendo, portanto, a sociedade a oportunidade de melhor os gerir se não fossem obrigados a entregá-los ao Estado.
Quanto à transparência, os cidadãos, pela Constituição, têm o direito de saber para que finalidades o Estado usa o seu dinheiro, de uma forma limpa, sem corrupção. E a verificação deste direito fundamental da nossa Constituição não se esgota nas eventuais formas de participação na elaboração do Orçamento Geral do Estado ou na obtenção de informações, mais ou menos detalhadas, quanto às opções que daí constam.
A Transparência Internacional - uma organização mundial que se destaca na apresentação de casos de corrupção e de falta de transparência de todos os países do mundo - coloca o nosso País nas posições inferiores da sua escala de valores.
Também neste caso são formuladas diversas críticas quanto à forma como o indicador é construído, mas o 'Índice de Percepção da Corrupção' continua a ser a única medida utilizada pela maior parte das organizações do Estado ou da sociedade civil para se avaliar o grau de transparência dos governos, em especial, na utilização dos seus recursos financeiros. A posição de Angola, em 2014, foi a 161.ª, num total de 175 países.
Em matéria específica de transparência orçamental, medida pelo índice 'Open Budget Index'3, Angola é igualmente considerado um país opaco. Na verdade, a sua pontuação em 2012 foi de 28 pontos (num total de 100) e 26 pontos em 2015.
Significam estas classificações que o nosso País tem uma transparência orçamental insuficiente e mínima, em qualquer um dos anos. Fica-se, portanto, com a certeza de que não é apenas quanto à garantia dos direitos de manifestação que o nosso País é deficitário. Nos direitos humanos económicos e sociais há igualmente muito que fazer para que o País melhore, substancial e sustentadamente, a sua imagem de credibilidade.
Alves da Rocha - Economista
 
                











