O património cultural pode virar fonte rendimento para as pessoas das comunidades
Foi a não funcionalidade das fitas magnetofónica, que estão no museu do Dundo, que despertou a curiosidade do investigar espanhol David Sáez. Após dois anos de investigação, o resultado está exposto até 19 de Março, no Centro Cultural Camões. Ao Expansão, o pesquisador revela que o som do Kisanji pode ser incluído em vários estilos musicais produzidos no País.
O que é o Thambwé?
Thambwé é um projecto, cujo nome completo é Thambwé recuperação, valorização e divulgação do património musical cokwe. É um projecto apoiado pelo Procultura, programa com financiamento da União Europeia, através do Instituto Camões. O Thambwé também contou com o apoio da embaixada de Espanha e a OPEN Eart Fundation, uma fundação de Bruxelas, a gestão financeira teve apoio da Jesuit Refugee Service Angola (JRS) e o projecto foi implementado no Museu Regional do Dundo.
E qual foi o valor investido?
Foram investidos 40 mil euros, 35 mil através do Procultura, que, como falei, é financiado pela União Europeia. E depois tivemos 5 mil euros de cofinanciamento entre a Embaixada de Espanha e a Open Air Foundation.
De que se trata concretamente o projecto?
O que tratamos no projecto posso resumir em três eixos, nomeadamente, a recuperação, transmissão e a divulgação do património musical cokwe.
Como foi feito esse processo?
Relativamente à recuperação, o que o projecto fez foi digitalizar o fundo fonográfico do Museu Regional do Dundo. Sendo que o museu tem um importante acervo de músicas que foram gravadas pela extinta Companhia de Diamantes de Angola (Diamang). Fizeram muita recolha de música da região, mas hoje em dia estes materiais estão no formato de fita magnetofónica, fitas grandes e o museu não tem meios para reproduzir. Então, foi aqui que surgiu a ideia de digitalizar e trazer de volta aquelas músicas, porque lá no museu não havia forma de as ouvir. De ressaltar que nem tudo estava no museu, havia uma parte que, na altura, estava em Espanha, que doou uma cópia. Foi essa a primeira actividade.
E tiveram acesso ao material que estava em Espanha?
Sim. Fui a Barcelona ao Fundo de Música Tradicional, no instituto Milan Fontanas, do Conselho Superior de Investigação Científica, e eles tinham uma cópia já digitalizada e resolveram fazer uma doação para trazer de volta a Angola. Este foi um resultado importante, a digitalização e recuperação destas músicas que no dia da inauguração foi entregue ao Ministério, para ficar para Angola. Todo o material digitalizado foi gravado num disco rígido, em formato digital.
Além do que estava no museu, tiveram contacto com o que as pessoas fazem na actualidade?
Após o primeiro processo, fomos às aldeias para encontrar o que ainda existe nos dias de hoje. Fomos à aldeia procurar músicos e artesãos que constroem os instrumentos musicais e encomendamos instrumentos para oferecer à futura escola.
Por quantas aldeias passaram?
A pesquisa foi feita em 11 aldeias da Lunda Norte.
E foi criada a escola?
Sim, recuperámos um património e a ideia não é que fique numa gaveta. A nossa ideia é trazer de volta à vida. Então criámos uma escola, onde foram transmitidas as músicas digitalizadas, ou seja, as músicas antigas cokwe é que foram ensinadas na escola. A escola é no Museu Regional do Dundo. Tivemos aulas de dança, percussão, canto e de kisanji.
Tiveram quantas salas de aulas?
Foram duas salas de aulas. Um espaço que está em construção do museu.
Quantos alunos tiveram?
Tivemos 30 crianças. No evento de inauguração, que foi na semana passada, conseguimos trazer uma representação, trouxemos um grupo de oito pessoas, sendo seis alunos e dois professores, que fizeram um concerto no Centro Cultural Camões.
Como é que as crianças chegaram ao projecto?
A inscrição foi aberta. O único critério eram crianças entre 10 e 20 anos, do Dundo. Nós, na altura, isso foi em Janeiro de 2023, lançámos um convite na rádio. Abrimos uma semana para fazer as inscrições dos interessados.
Como foram seleccionados os professores?
Para a selecção dos professores, tivemos em conta, por um lado, que fossem pessoas que já tivessem uma trajectória, com grupos de música, de experiência, e, ao mesmo tempo, que fossem conhecedores da tradição. Então, fomos procurar os melhores e seleccionamos. Por exemplo, o professor de canto é o cantor do antigo grupo Banda Musical "Os Mimos". Uma banda antiga, que em Luanda se escutou muito.
Leia o artigo integral na edição 766 do Expansão, de sexta-feira, dia 08 de Março de 2024, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)