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Grande Entrevista

"É preciso formação para aplicar a nova lei da contratação pública"

Lara Craveiro, especialista em contratação pública

O lançamento do seu segundo livro sobre contratação pública foi o mote para a conversa com Lara Craveiro que defende o empenho dos gestores para o alcance do bem público e acredita que a nova lei da contratação pública auxilia o combate à corrupção.
É a convidada da Grande Entrevista.

A nova lei da contratação pública vigora desde Janeiro, como avalia a contratação pública no País?

Parece-me que o legislador, ao elaborar esta lei, teve presente o contexto macroeconómico do País. A nova lei apresenta modalidades contratuais que permitem agilizar certos instrumentos contratuais, como as concessões directas ou via parcerias público-privadas, garantindo a afectação de bens e serviços (especialmente para as infra-estruturas) onde se verifica a partilha de riscos financeiros com o privado. Com alterações pontuais, pretende-se suprir lacunas e incongruências, simplificando procedimentos, garantindo maior eficácia do sistema e implementando procedimentos abertos. Esta Lei apenas foi publicada a 23 de Dezembro de 2020 (começou a vigorar 30 dias depois), pelo que me parece pouco razoável poder-se já aferir o impacto que a mesma causou na contratação pública.

As Entidades Públicas Contratantes (EPCs) têm o domínio da lei?

O domínio de um determinado dispositivo legal, como é o caso da Lei dos Contratos Públicos (LCP), é um axioma, porquanto, acredito que seja inalcançável. As EPCs vão interpretando e aplicando cada vez melhor a lei. Existem novas Entidades Públicas Contratantes, que até então não eram sujeitos passivos, não constavam do âmbito subjectivo da lei. Apesar de não ter dados estatísticos existe uma maior preocupação das entidades públicas no cumprimento da Lei dos Contratos Públicos, não obstante entender que seja necessária formação adequada para que possamos atingir a excelência.

Alguns contratos públicos ainda são feitos com várias irregularidades. O que falta para que passem a estar mais em conformidade?

Obviamente que ainda vamos tendo irregularidades, imperfeições, vícios, ou escolhas erradas de procedimentos. É necessário formação no âmbito de aplicação desta nova lei. A capacitação no âmbito da LCP deve ser contínua sendo certo que só poderemos suprir estas debilidade com formação. Refira-se, contudo, que as EPCs têm vindo a trabalhar no sentido de colmatar essas possíveis falhas. Temos ainda alguns desafios pela frente, mas nada que, com esforço e dedicação, seja inalcançável.

Ao não responsabilizar directamente o gestor público a Lei dos Contratos Públicos não acaba por ser permissiva?

Nos termos do artigo 8.º da LCP os funcionários, agentes públicos e membros da comissão devem exercer as suas funções de uma forma imparcial. Devem prosseguir o interesse público e os objectivos determinados, nas normas e os procedimentos, evitando conflitos de interesse; não praticar, não participar ou não apoiar actos subsumíveis nos crimes de corrupção activa, passiva ou fraudulentos; observar as leis, os regulamentos e as normas relativas à conduta dos funcionários públicos e o regime geral de impedimentos e incompatibilidades em vigor para a administração pública. Se os funcionários ou demais agentes não actuarem de acordo com os deveres a que se encontram adstritos cometendo uma infracção disciplinar, poderão vir a ser sancionados.

A lei impõe o concurso público como preferencial em processos de contratação, mas vemos que a contratação simplifica (ajuste directo) acaba por ser a mais utilizada pelos gestores públicos. Isso não retira transparência nos processos?

O concurso público é, certamente, o procedimento de excelência da contratação pública e o que melhor assegura a concorrência, transparência e a publicidade. É caracterizado pela possibilidade de todo e qualquer interessado poder participar apresentando uma proposta, de forma paritária. Desta forma, promove-se, maior concorrência e competitividade entre todos os concorrentes fomentando a transparência na escolha do potencial co-contratante da EPC. Em todas as suas fases, verificamos a observância dos princípios fundamentais da contratação pública. Este tipo concursal caracteriza-se por ser um procedimento aberto e amplo, capaz de admitir como concorrentes todas aquelas entidades que reúnam os requisitos técnicos, financeiros e profissionais legalmente exigidos.

Faltará fiscalização nos procedimentos concursais?

A fiscalização dos procedimentos concursais aumentou exponencialmente, devido não só ao trabalho do Serviço Nacional de Contratação Pública, Tribunal de Contas, mas também às exigências da nossa sociedade que se quer moderna. Temos, contudo, caminho pela frente a ser percorrido.

O relatório anual de 2020 do Serviço Nacional da Contratação Pública indica que a contratação simplificada no ano passado foi a que teve a maior despesa entre os processos comunicados. Como se altera este quadro?

A escolha do procedimento de Contratação Simplificada (procedimento fechado) tem a ver com o valor do contrato. Ou excepcionalmente com critérios materiais. Entre eles, motivos de urgência imperiosa quando, por imposição do interesse público, se deve proceder à aquisição de bens ou serviços com a máxima rapidez sem se realizar, quando a lei o prevê, concurso público, podendo estar, deste modo, a violar o princípio da concorrência. E recorre-se a tal solução, sob pena de, não o fazendo com a máxima rapidez, os danos daí decorrentes causarem ou poderem vir a causar prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação. O que aqui está em causa é um valor superior que é o interesse público. A nova lei torna a execução dos procedimentos mais prática, desincentivando a tendência dos órgãos máximos das EPCs preferirem procedimentos fechados aos abertos, por razão de burocracia.

(Leia a entrevista integral na edição 639 do Expansão, de sexta-feira, dia 27 de Agosto de 2021, em papel ou versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui)