RDC apela a embargo total às exportações de minerais do Ruanda
Todas as partes interessadas, "incluindo os consumidores finais de produtos mineiros", devem comprometer-se com "uma cadeia de abastecimento responsável", afirmou a ministra das Minas da RDC, Antoinette Kalambayi, após advogados mandatados pelo país ameaçarem a Apple por utilizar minerais saqueados à RDC.
A República Democrática do Congo (RDC) apelou a um embargo internacional às exportações de minerais do Ruanda, país que acusa de roubar os seus recursos com o apoio ao grupo rebelde M23, que fomenta a guerra ao longo da fronteira partilhada para apreender minas e saquear minerais, que depois exporta como se fossem seus.
O apelo ao boicote tem por base a ideia de que se o Ruanda não conseguir lucrar com o seu alegado apoio a grupos rebeldes armados no leste da RDC terá menos incentivos para financiar a violência no país vizinho, que este domingo sofreu uma tentativa de golpe de estado, segundo o porta-voz do exército congolês, general Sylvai Ekenge.
A alegada tentativa de golpe foi liderada por Christian Malanga, um congolês que vivia nos EUA e que foi morto pelos militares, e envolveu dois cidadãos americanos, Cole Ducey e Benjamim Polun, como noticiou a Voa. A embaixadora dos EUA em Kinshasa, Lucy Tamlyn manifestou-se "chocada" e disse, numa publicação na rede social X, estar a "cooperar com as autoridades da RDC".
Em declarações à Bloomberg, a ministra das Minas da RDC, Antoinette N"Samba Kalambayi, defendeu que todos os produtos mineiros originários do Ruanda deveriam ser classificados como "minerais de sangue" devido a alegações de que o seu comércio contribui para o conflito em curso no leste do país. "Todas as partes interessadas, incluindo os consumidores finais de produtos mineiros", devem comprometer-se com uma "cadeia de abastecimento responsável e ser decretado um embargo contra o Ruanda", defendeu a ministra.
O apelo da RDC surge após os "rebeldes do M23, que têm fortes laços com as elites étnicas tutsis do Ruanda, tomarem a cidade mineira de Rubaya, no leste do Congo, onde existem depósitos de tântalo", refere o jornalista Matthew Kendrick. Este mineral é usado em todos os tipos de aplicações de alta tecnologia, desde a câmara dos smartphones aos chips semicondutores cruciais para a revolução da IA, mas "é difícil de encontrar, sendo o Congo uma das fontes mais ricas do mundo".
Quase 6 milhões de congoleses já tiveram de fugir dos combates no leste do país. Os rebeldes do M23 controlam actualmente grandes áreas da província do Kivu do Norte e cercam a sua capital, Goma, onde mais de um milhão de deslocados se amontoam em campos.
Apple utiliza "minerais de sangue", alega RDC
Antes de a RDC lançar o apelo ao embargo, um grupo de advogados internacionais notificou, no final de Abril, o CEO da Apple, Tim Cook, ameaçando a empresa com uma acção judicial, caso não deixe de usar minerais contrabandeados da RDC na produção dos seus dispositivos electrónicos.
O grupo de advogados, liderado por Robert Amsterdam, da Amsterdam & Partners LLP, com sede em Washington, e William Bourdon, da Bourdon & Associés, sediada em Paris, dá três semanas à Apple para responder a um conjunto de perguntas que têm por base um relatório, de 53 páginas, intitulado "Minerais de Sangue - a Lavagem de Minerais 3T da RDC pelo Ruanda e Entidades Privadas".
A capa do relatório tem estampada uma declaração popularizada por jogadores de futebol congoleses em recentes protestos silenciosos: "Todos vêem os massacres no leste do Congo, mas todos estão em silêncio".
Segundo Robert Amsterdam, "ano após ano, a Apple vendeu tecnologia feita com minerais provenientes de uma região cuja população está a ser devastada por graves violações dos direitos humanos". As alegações da empresa de que "verifica a origem dos minerais que utiliza para fabricar os seus produtos", segundo o jurista, "não parecem basear-se em provas concretas e verificáveis", já que a Apple depende de uma "série de fornecedores que compram minerais do Ruanda, um país pobre em minerais que tem saqueado a RDC e os seus recursos naturais" durante quase três décadas.
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