Retirar ou não retirar o subsídio aos combustíveis? Esta não é a questão!
Apesar de terem combustível subsidiado, ainda assim, os produtores nacionais têm deixado bem claro que é muito mais oneroso produzir em Angola do que, por exemplo, em outros países da região SADC (para muitos produtos).
Há algum tempo demos conta de uma notícia segundo a qual o Executivo não espera retirar o subsídio aos combustíveis em 2023. A ser verdade, acreditamos que o Executivo possa ter dificuldades de explicar aos parceiros internacionais a razão desta decisão. Afinal, quando o Executivo solicitou ao FMI um programa ampliado de financiamento, manifestou a intenção de, no âmbito da estabilidade macroeconómica, manter os subsídios abaixo de 1% do PIB fazendo com que as empresas públicas melhorassem a sua eficiência.
O Executivo mostrou igualmente a necessidade de se ajustarem as tarifas de água, transportes públicos e energia eléctrica, bem como de, gradualmente, ajustar o preço dos combustíveis (o que não aconteceu). Vale recordar que o FMI apoiou essa retirada gradual, sustentada pela implementação de um programa de transferências sociais monetárias. No caso de Angola, criou-se o Kwenda, um programa que teve o financiamento de cerca de 320 milhões USD do Banco Mundial.
No relatório de fundamentação do OGE de 2021 o Executivo indicou que iria fazer, naquele ano, a "implementação de um mecanismo de precificação automática dos combustíveis", o que acabou por não acontecer. Se na altura, os analistas diziam que era apenas uma questão de tempo, e que tal poderia acontecer tão logo terminasse o período eleitoral, essa notícia acaba por ser uma enorme surpresa. Afinal, se o programa Kwenda já está a ser implementado e as notícias indicam que tudo vai bem, não vemos razão para se adiar essa retirada gradual dos subsídios.
Não tendo os números exactos do que se gasta com os combustíveis, apenas vemos no OGE 2022 cerca de 1,9 mil milhões USD (ao câmbio do BNA) nas despesas com subsídios. Acreditamos que grande parte desta despesa possa estar relacionada com os combustíveis. Como se pode ver, trata-se de um custo muito alto que poderia ser usado para melhorar alguns serviços ligados ao sector social ou até mesmo servir para construir infraestruturas que concorressem depois para dinamizar o sector produtivo.
Porquê essa preocupação com o subsídio aos combustíveis? Ora bem, Angola importa grande parte do combustível que consome. De facto, os dados preliminares do BNA (DES) sobre a importação por categoria de produto (no 1.º Trimestre) mostram que a importação mensal de combustível neste ano terá custado ao País cerca de 223,72 milhões de USD. Esses dados ajudam a explicar essa necessidade de se retirar o subsídio aos combustíveis. O sector produtivo nacional, agricultura e indústria transformadora, e serviços (transportes), depende muito do combustível. Apesar de terem combustível subsidiado, ainda assim, os produtores nacionais têm deixado bem claro que é muito mais oneroso produzir em Angola do que, por exemplo, em outros países da região SADC (para muitos produtos).
Uma retirada do subsídio pode fazer com que os produtos feitos em Angola cheguem aos consumidores num preço mais elevado. Até os produtos importados, que depois são transportados dos portos para os centros de armazenagem e distribuição, poderão chegar aos consumidores a um preço alterado. Claramente que o Executivo tem aqui um dilema muito sério. Os subsídios representam um fardo muito pesado e insustentável, mas retirar pode fazer disparar a inflação, com sérias implicações na qualidade de vida das populações.
A alternativa, em nosso entender, passa por fazer com que os investimentos feitos na produção de utilidades como água e energia eléctrica, falamos aqui das grandes barragens como Laúca, tenham um impacto no sector produtivo. Das nossas pesquisas tomamos nota de que apesar do aumento na produção, faltou investir nas linhas de transporte de electricidade.
Aqui poder-se-ia abrir espaço para o sector privado investir. Uma vez assegurada a produção de electricidade, havendo bons incentivos, acreditamos que o sector privado nacional e/ou até mesmo estrangeiro possa abraçar este desafio. Mais do que gerar electricidade, a aposta deve ser em fazer chegar a energia lá onde se esteja a produzir afinal, não se compreende como uma unidade fabril no Polo Industrial de Viana, ou um agricultor na zona do Dungo, Quiminha ou Cabire, precisa de gerador/combustível para produzir. Essas incongruências devem merecer a atenção do Executivo neste início de funções.
Enfim, visto desta forma fica claro que a questão não se limita apenas em sabermos se deve ou não o Executivo retirar o subsídio aos combustíveis. A verdadeira questão é como fazer com que os combustíveis deixem de ter a preponderância que têm hoje no sector produtivo. A solução, avançada aqui, passa por canalizar investimentos (incluindo de privados) que possam fazer com que a electricidade que hoje já é produzida de forma limpa e sustentável, chegue nas zonas de produção (agrícola e industrial). Combinando essa solução com outras iniciativas, como o Simplifica e o programa integrado de intervenção nos municípios, é possível melhorar a competitividade dos produtos feitos em Angola.