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Opinião

A redução do desemprego passa pela dinamização do sector agrícola

MILAGRE OU MIRAGEM?

Fernandes Wanda, em artigo de opinião sobre a importância do sector agrícola para dinamizar a redução do desemprego, defende que é necessário incentivar a produção local de inputs como fertilizantes e sementes

Quando o Executivo angolano deu início ao acordo alargado ao abrigo do Programa de Financiamento Ampliado do FMI, assinalámos que a reforma estrutural (sinónimo de liberalização) em curso apesar de necessária para a estabilidade macroeconómica, não era sinónimo de transformação estrutural, i.e., a reforma estrutural não iria tornar Angola menos dependente das receitas provenientes das exportações de matéria-prima.

No caso de Angola o sector dominante ainda é o petrolífero, intensivo em capital, no entanto, menos intensivo em mão-de-obra. Para piorar a situação, dada a forma como este sector se encontra estruturado, não incorpora tanto conteúdo local como seria desejado. Por esta e outras razões que temos analisado aqui neste espaço, não nos surpreendemos que os últimos dados sobre a situação do emprego em Angola divulgados pelo INE mostram que o desemprego ainda é uma preocupação.

No primeiro trimestre de 2022, a taxa de desemprego situou-se acima dos 30%, mas é preciso destacar o desemprego juvenil (15-24 anos) que permanece acima dos 50%. Em Angola o acesso ao trabalho é um direito constitucionalmente consagrado (artigo 76º da Constituição), o que significa que compete ao Estado fomentar políticas de emprego para os cidadãos. Não é por acaso que na tomada de posse o Presidente da República faz um juramento, artigo 115.º, de "Defender (...) o bem-estar e o progresso social de todos os angolanos". Pelo que é válido perguntar, como assegurar o progresso social de todos os angolanos quando 57,2% dos jovens (15-24 anos) estão desempregados?

Ora bem, o Executivo gizou o Plano de Acção para Promoção da Empregabilidade, que, dentre outras coisas, cria programas de formação em empreendedorismo bem como tem permitido a disponibilização de kits de auto-emprego. Essas acções, em nosso entender, mais não fazem do que assumir que, para o Executivo, as pessoas estão desempregadas por falta de um "espírito empreendedor"! Afinal, a evidência empírica mostra que, à medida que os países se desenvolvem, o auto- -emprego reduz e aumenta o emprego assalariado.

A transformação estrutural da economia angolana que defendemos ser necessária, envolve mudanças na composição das importações, i.e., uma redução progressiva das importações de bens de consumo corrente, passando a priorizar bens de consumo intermédio e de capital. Ela passa igualmente pela dinamização de sectores intensivos em mão de obra, com vista a absorver grande parte da população desempregada e/ou que encontra emprego no sector informal da economia, como acontece hoje em Angola (80,5% das pessoas empregadas no 1.º trimestre).

O sector da agricultura continua a empregar grande parte da população (55,5%), segundo os dados do INE, o que é uma característica dos países em desenvolvimento. Naqueles países onde ocorreu uma transformação da estrutura da economia de uma forma bem- -sucedida, é notável a presença de uma indústria transformadora forte. Tudo começa pela criação de uma indústria transformadora que dentre outras coisas permite a mecanização da actividade agrícola.

Em Angola já existe a montagem de tractores, contudo, muito dependente das importações sem que se vislumbre, por parte do Executivo angolano, uma estratégia que possa permitir a incorporação de conteúdo local neste processo nos próximos 5 anos. Para além da mecanização da agricultura, é necessário incentivar a produção local de inputs como fertilizantes e sementes melhoradas, criar infraestruturas produtivas (como perímetros irrigados) e disponibilizar serviços de extensão agrária.

A jusante, deve-se incentivar o surgimento de uma indústria transformadora capaz de absorver muito do que possa ser produzido pelo sector agrícola. Abrimos aqui um parêntesis para sugerir a criação de indústrias intensivas em mão de obra. Apresentado desta forma fica claro que para um país como Angola, apostar na dinamização da agricultura acaba por ser um imperativo, já que permitiria simultaneamente combater a inflação de forma sustentável bem como reduzir a importação de bens de consumo corrente.

Dinamizar o sector agrícola através da criação de uma indústria transformadora, conforme apresentamos acima, permite criar empregos no sector formal da economia (muito melhores do que aqueles criados no sector informal) para aqueles que possam ser afectados pelo aumento da produtividade no sector. Na ausência de uma agricultura dinâmica o desemprego em Angola tornou- -se persistente o que, conforme nos sugere Delong (2012), acaba por ser um impedimento para a recuperação económica do País.

Dada a dificuldade de inserção no mercado de trabalho, muitos recém graduados acabam por ver as suas habilidades e competências tonarem-se obsoletas sem que delas o País e os próprios indivíduos tenham tirado proveito. Enfim, tal como aconteceu em quase todos os países que hoje são considerados ricos, em Angola o progresso e bem estar social que um emprego no sector formal da economia proporciona passa necessariamente pela dinamização do sector agrícola.

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